Bruno de Carvalho: "Plantel recusou 500 mil euros para ganhar ao Benfica"

O ex-presidente do Sporting foi ouvido pelo juiz Carlos Delca na segunda sessão da instrução do processo. Bruno de Carvalho defendeu que "a obrigação de um presidente é ser exigente".

Era o momento mais aguardado da segunda sessão da instrução do processo: a audição do ex-presidente do Sporting, Bruno de Carvalho. Isto depois de ontem o magistrado Carlos Delca ter decidido iniciar a fase de instrução, apesar de ter sido interposto um quarto incidente de escusa de juiz, com o objetivo de adiar pela terceira vez o arranque deste passo processual.

Interrogado pelo juiz Carlos Delca, Bruno de Carvalho disse que desconhecia quaisquer problemas entre adeptos e jogadores. Apesar de ter havido notícias sobre problemas do jogador Acuña com a claque, o ex-presidente afirma que quando falou com o futebolista ele afirmou que tudo estava sanado.

Na sessão ainda a decorrer, Bruno de Carvalho disse também que as publicações no Facebook que escreveu tinham como objetivo exigir responsabilidades aos atletas."A obrigação de um presidente é ser exigente. Exigir responsabilidades. No meu último ano como presidente fomos campeões em todas as modalidades menos no futebol masculino", afirmou, acrescentando: "Fiz publicações a exigir responsabilidade a outras modalidades e nunca houve essas reações."

Mantendo o que já tinha dito quando foi interrogado, Bruno de Carvalho disse que nunca trocou informação com a claque do Sporting sobre o desempenho dos futebolistas. "Nunca falei com elementos das claques sobre o rendimento dos jogadores". Mais: "Nunca disse façam o que quiserem aos jogadores".

Os jogadores do plantel profissional recusaram um prémio de meio milhão de euros que lhes foi oferecido antes do jogo com o Benfica e com o Marítimo, adiantou ainda o ex-presidente. Estes foram os últimos jogos do campeonato de 2017/2018.

"Estava numa reunião com o departamento jurídico e a administração da SAD por causa de uma notícia sobre o envolvimento do Sporting no processo 'Cashball', quando o José Ribeiro [do departamento de comunicação] irrompeu pela sala a dizer que estavam a invadir a academia. Disse-lhe para ligar ao funcionário Jorge Jesus para saber se ainda lá estavam".

A Jorge Ribeiro, "o funcionário Jorge Jesus disse para eu não ir lá", continuou o antigo presidente do Sporting relatando os factos ocorridos no dia 15 de maio.

O interrogatório terminou às 16:20, com um Bruno de Carvalho irritado com a procuradora.

Cândida Vilar disse que não percebia por que razão estava a falar de Jorge Jesus "que não é arguido no processo" e "por que lhe chama funcionário quando ele era o treinador de futebol".

O advogado de Bruno de Carvalho pediu silêncio ao seu cliente, uma vez que começava a entrar em diálogo com a procuradora. O ex-presidente do Sporting Saiu da sala e foi fumar um cigarro.

Eduardo Nicodemus, que está em prisão preventiva, e que fez depoimento esta manhã, sentiu-se mal durante a tarde, enquanto o juiz ouvia Bruno de Carvalho. Saiu da sala antes de terminar a sessão e não voltou.

Jorge Jesus e André Geraldes, os outros protagonistas da sessão

Os depoimentos desta tarde acabaram também por dar visibilidade a duas pessoas que não fazem parte do processo: o treinador Jorge Jesus - ou o funcionário Jorge Jesus, dependendo de quem se refere a ele, a procuradora Cândida Vilar ou os antigos elementos do clube - e ao team manager André Geraldes.

O primeiro porque foi avisado a 14 de maio de que iria ser despedido no final da época e o segundo por não ter avisado ninguém do ataque à Academia, um facto que não se conseguiu saber se era do seu conhecimento.

As contradições de Bruno de Carvalho, José Ribeiro e André Geraldes

De entre as declarações ouvidas esta tarde no tribunal um dos momentos mais relevantes surgiu com a diferença de depoimentos entre Carlos Vieira (antigo vice-presidente do Sporting na equipa de Bruno de Carvalho), Jorge Ribeiro (estava no departamento de comunicação do clube) e Bruno de Carvalho.

O presidente garantiu que depois de o avisar do que se passava em Alcochete, José Ribeiro ligou para Jorge Jesus para saber o que se passava. Terá sido este elemento da equipa de comunicação que falou com o treinador, na versão de Bruno de Carvalho.

Já José Ribeiro garantiu que esse contacto com o treinador Jorge Jesus foi feito por André Geraldes - o team manager. E que foi a este responsável que Jorge Jesus disse não querer o presidente na Academia.

Nas suas declarações, José Ribeiro contou ainda que André Geraldes só conseguiu falar com Jorge Jesus 30/40 minutos depois de se saber o que estava a acontecer em Alcochete.

Já Carlos Vieira afirmou que a reunião da administração com o departamento jurídico por causa do processo 'Cashball' tinha sido de manhã - e não de tarde como frisou Bruno de Carvalho - e que à hora do ataque estava a dar uma entrevista à Sporting TV. Acrescentou também que André Geraldes esteve na reunião da manhã mas que não se lembra de o ver de tarde.

Num outro momento de tensão, durante o interrogatório ao antigo vice-presidente da administração de Bruno de Carvalho, Cândida Vilar alongou-se numa questão e foi interrompida pelo ex-líder do Sporting. A procuradora disser que era livre, Bruno de Carvalho respondeu: "Você é, mas eu não sou e por causa."No intervalo de dez minutos antes de ser ouvida a última testemunha, Bruno de Carvalho saiu da sala de audiência, alegando sentir-se mal e já não voltou.

Bruno de Carvalho aplaudido à entrada do tribunal

Bruno de Carvalho chegou ao tribunal pouco antes das 14.00 e foi aplaudido por cerca de duas dezenas de apoiantes à entrada do Campus de Justiça. O ex-presidente do Sporting chegou acompanhado pela irmã, Alexandra Carvalho.

A presença do antigo líder do clube foi a que motivou mais interesse ao ponto de horas antes da sua chegada já estarem alguns apoiantes de Bruno de Carvalho no exterior do tribunal. A expectativa de poderem estar mais durante a tarde levou a PSP a manter vigilância apertada - como fez na terça-feira - com cerca de uma dezena de elementos dentro da sala de audiência junto dos 23 arguidos presentes e pelo menos seis agentes da Unidade Especial de Polícia no exterior do edifício.

Detidos de Alcochete querem todos ir para casa com pulseira eletrónica

A grande maioria dos elementos da Juventude Leonina que está detida preventivamente na sequência do ataque à Academia do Sporting pediu nas últimas semanas ao juiz de instrução criminal do Barreiro para que seja alterada a atual medida de coação: pretendem ficar em casa com pulseira eletrónica. Neste momento estão na cadeia 36 dos 44 acusados neste processo, acusados de vários crimes, sendo o mais contestado o de terrorismo.

Quem tinha a expectativa de ir esta quarta-feira para casa era o ex-líder da principal claque do Sporting, Fernando Mendes, devido ao facto de sofrer de um grave problema de saúde. Depois de algumas semanas a aguardar uma decisão, esta terça-feira, após insistência da sua advogada no final da primeira sessão da fase de instrução, o juiz Carlos Delca disse que iria decidir a favor desse pedido. A advogada Sandra Martins tinha a expectativa que esta quarta-feira, Fernando Mendes fosse autorizado a ir para casa mas o juiz Carlos Delca ainda não tinha assinado esse despacho ao final da tarde Fernando Mendes está detido desde junho do ano passado.

O mais recente volume do processo que está hoje no segundo dia da fase de instrução tem inúmeros pedidos dos advogados a requerer que os técnicos da Direção-Geral de Reinserção Social elaborem relatórios sobre a situação pessoal, familiar, laboral e social dos seus clientes e das pessoas com quem eles possam viver.

Após a apresentação do pedido, é ao juiz, neste caso o magistrado Carlos Delca, que compete pedir esta análise e o respetivo parecer, como está previsto na Lei n.º 33/2010, de 2 de setembro, que regula os "meios técnicos de controlo à distância (vigilância eletrónica)". Quando recebe esse documento - os que o DN viu tinham todos parecer positivo por parte dos técnicos - decide se autoriza a alteração de prisão preventiva numa cadeia para a vigilância eletrónica em casa ou mesmo outra medida menos gravosa.

Os pedidos de alteração foram sendo feitos ao longo deste último ano - os primeiros 23 detidos ficaram em prisão preventiva em 21 de maio de 2018, seis dias depois do ataque - e todos foram recusados pelo juiz, que depois foi vendo o Tribunal da Relação de Lisboa confirmar as suas decisões.

A exceção aconteceu com Celso Cordeiro - um dos seis elementos que pediu para ser ouvido na fase de instrução, o que aconteceu esta terça-feira - que viu em maio o Tribunal da Relação de Lisboa decidir a seu favor e mandar que ficasse com pulseira eletrónica em casa.

Depois dessa decisão, mais dois detidos viram a medida de coação alterada: João Quaresma Gomes e Miguel Ferrão. O primeiro no seguimento de um pedido do advogado e o segundo foi o próprio Ministério Público que o propôs. Aliás, como a procuradora Cândida Vilar fez em relação a outros dois elementos: Jorge Serrão Almeida e Paulo Patarra. A justificação apresentada foi idêntica para os três - considerar o MP que já não existe o perigo de perturbação do inquérito e de continuação da atividade criminosa.

Num outro pedido, a posição do Ministério Público também é favorável até para permitir que em setembro o detido em causa possa começar a frequentar a faculdade, de forma a "sair da estrada de violência que percorreu e reiniciar um percurso compatível com os valores compatíveis com a vida em sociedade".

Nicodemus:"O senhor Manuel Fernandes disse 'vão-se embora daqui, isto não é o Sporting'"

Durante a manhã desta quarta-feira foi ouvido Eduardo Nicodemus - do núcleo da JUve Leo do Vale da Amoreira (Moita) que garantiu nada ter a ver com o ataque à Academia de Alcochete e afirmou que só lá foi a 15 de maio para ir buscar bilhetes para a final da Taça de Portugal que o Sporting iria disputar com o Desportivo das Aves. Garantiu que não entrou nos balneários e que já esta de saída quando viu os carros dos outros adeptos a dirigirem-se para o interior da Academia, tendo acabado por segui-los.

Dentro do recinto, onde entrou sozinho, disse ter visto o treinador Jorge Jesus "desesperado" a pedir ajuda e o "sr. Manuel Fernandes que [lhe disse] 'vão-se embora daqui, isto não é o Sporting'".

Uma das testemunhas contrariou a tese de Eduardo Nicodemus de que ia à Academia buscar bilhetes ao dizer que sabia que o responsável pelo núcleo do Vale da Amoreira (Moita) da Juventude Leonina ia buscar entradas à casinha - como é conhecida a sede da Juve Leo em Alvalade.

Dezenas de crimes em julgamento

A investigação ao que se passou no dia 15 de maio do ano passado na Academia de Alcochete terminou com a acusação de 41 pessoas, todos membros da Juve Leo, em coautoria de 40 crimes de ameaça agravada; 19 de ofensa à integridade física qualificada; 38 de sequestro mas classificados como terrorismo; dois de dano com violência; um de detenção de arma proibida e um de introdução em lugar vedado ao público. Há ainda acusações individuais de tráfico de estupefacientes.

Já Bruno de Carvalho, Nuno Mendes (Mustafá) e Bruno Jacinto (antigo oficial de ligação aos adeptos do Sporting) são considerados pelo MP os autores morais dos seguintes crimes: 40 de ameaça agravada; 19 de ofensa à integridade física qualificada; 38 de sequestro mas classificados como terrorismo; um de detenção de arma proibida agravado.

Mustafá pediu para assistir aos depoimentos, mas não chegou a tempo aos serviços prisionais, que se atrasaram a trazê-lo. Neste segundo dia, há muitos familiares a querer assistir.

Notícia atualizada às 18.00 com as últimas declarações em tribunal

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