Frigoríficos, atrasos e rezas na vingança pronta há 60 anos
Em 1951, o Lille afastou o Sporting da final da Taça Latina. O outrora leão Mário Wilson relembra o amadorismo da época, quando só se treinava três vezes por semana
Já lá vão quase 60 anos. Na altura a grande prova da Europa do futebol denominava-se Taça Latina.
Em 1950, o vencedor tinha sido o Benfica, mas em 1951 o Sporting queria imitar a graça do seu rival. Para isso teria de ultrapassar o Lille nas meias-finais a realizar em Turim, Itália.
Sem Peyroteo, que se tinha transferido para o Belenenses, o Sporting deu oportunidade a dois jovens reforços provenientes de Moçambique que viriam a ser figuras ilustres do futebol português: Juca e Mário Wilson. Na frente de ataque pontificavam quatro dos célebres cinco violinos - Vasques, Jesus Correia, Travassos e Albano.
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"É uma sensação brutal recordar esse tempo", diz, com emoção, Mário Wilson ao DN. "Vim substituir o Peyroteo, cheguei a Portugal com o Juca, um estilista da bola", afiança o homem que nessa temporada fez 14 golos, os mesmos que Jesus Correia e menos 20 que… Vasques. "Poucos se lembram que quando cheguei a Portugal foi para jogar no Sporting. Sobre o Lille, na época era uma equipa relativamente famosa… e profissional. Do jogo, o primeiro, tenho ideia de que houve um atraso, chegámos na véspera à meia-noite, o que era normal por causa dos transportes…", lembra.
O Sporting empatou a primeira partida a um golo e o encontro teve mesmo de terminar porque as equipas não desempatavam e a luz artificial era algo que não existia. No jogo de desempate, os franceses, mais frescos, pois tinham chegado a tempo e horas a Itália, golearam 6-4 (após prolongamento), com três golos de Vasques (e outro de Caldeira) para os leões. E termina aqui a relação entre Sporting e Lille, que acabaria goleado na final pelo AC Milan (0-5).
A verdade é que desse duplo encontro saiu uma história. Vários clubes italianos e, inclusivamente, o Benfica tentaram contratar o "violino" Vasques, mas Ribeiro Ferreira, presidente do Sporting à altura, convenceu o avançado a permanecer aumentando o seu vencimento para 1200 escudos. Mas não ficou por aí. "Segundo sei, ajudou o Vasques a montar um negócio de frigoríficos do qual o Travassos foi também sócio. Era uma situação habitual. O Sporting ajudava os seus jogadores, que não eram profissionais, a terem bons empregos", refere ao DN o actual presidente da Assembleia Geral do Sporting, Dias Ferreira.
Mário Wilson confirma o amadorismo. "Só treinávamos três vezes por semana. Tínhamos um inglês como treinador, o Randolph Galloway. Não falava português, mas achávamos piada às suas expressões. Sabia dinamizar um grupo que já era fantástico", remata.
E para o jogo de hoje (18.00, Sport TV1)? "Sou benfiquista mas quando uma equipa portuguesa joga no estrangeiro não me prostituo. Não rezo para que ganhem, mas desejo imensamente que possam vingar essa derrota de antes de Cristo", conclui.