28 maio 2016 às 00h58

"Campeão? Não vou ser hipócrita e dizer que não gostava"

Foi vice-campeão europeu júnior, mas depois percebeu que o freesurf o fazia mais feliz. A competição passou para segundo plano, mas Jervis está aí para as curvas, a bater-se com os melhores da Liga Moche

Pedro Miguel Neves

Nas duas últimas etapas da Liga Moche, na Caparica e em Matosinhos, foi terceiro. Ficou a um pequeno passo da final, que dá direito a sentir aquele amargo de boca. A boa fase competitiva permite que Filipe Jervis, 25 anos, entre para a reta final da Liga Moche em 4.º lugar do ranking nacional, com expectativas de surpreender os nomes mais consagrados do surf de competição. A uma semana do início da quarta etapa, na Praia Grande, o jovem falou ao DN sobre as suas expectativas.

Terminou as duas últimas etapas a um passo da final. Mesmo para quem se considera um freesurfer, isso aumentou a sua expectativa para a etapa da Praia Grande?

Expectativa cria sempre... mesmo que a pessoa não queira, acaba sempre por criar alguma vontade de vencer. Falta-me fazer uma final, nunca atingi uma na Liga e muito menos ganhei uma etapa. Faz-me querer ganhar, mas não cria qualquer tipo de pressão sobre mim.

Espera-se que surfistas como o Vasco e o Kikas, que estão a competir no Japão (circuito de qualificação para o Mundial), regressem a tempo desta etapa. É bom ou preferia que a etapa pudesse ser mais fácil?

Claro que é bom. Não tinha graça ter um campeonato sem os melhores surfistas. É giro estar lá a disputar o primeiro lugar com eles e provar que tenho nível para me bater lado-a-lado com os melhores.

Ser campeão nacional é um sonho, mesmo para um freesurfer?

Não vou ser hipócrita ao ponto de dizer que não gostava de ser campeão nacional, ainda mais com o nível que há neste momento. A competição não é prioridade na minha vida, mas se há essa possibilidade porque não tentar? Preciso de bons resultados nas próximas duas etapas, vou lutar por isso. Mas sempre com intuito super relaxado, sem qualquer tipo de pressão. Se conseguir consigo, se não para o ano há mais. Estou ali para me divertir, para mostrar o meu surf e para evoluir, porque quer queiramos quer não a competição ajuda a isso.

Está a atravessar uma boa fase, mas não é o único. Quem está em melhor posição para vencer na Praia Grande?

Os favoritos são os mesmos de sempre, são os mais consistentes. O Kikas [Frederico Morais], o Vasco [Ribeiro], o Gony [Zubizarreta] está a passar uma boa fase, o Pedro Henrique, o Saca... é por isso que a Liga este ano está a ser tão boa. Tivemos três vencedores diferentes em três etapas, por isso qualquer um dos tops tem nível para vencer na Praia Grande.

Ao fim destes anos, mantém a mesma opinião sobre as duas vertentes, competição e freesurf?

A minha vida competitiva correu como correu, fui vice-campeão europeu júnior. Se pudesse voltar atrás se calhar enfrentava a competição como olho hoje em dia, provavelmente estava a fazer tudo por tudo para estar com o Kikas, o Vasco e o Zé [Ferreira] para entrar no CT [divisão de elite mundial]. Cada pessoa percorre o seu caminho, tentei dois anos correr o QS [circuito de qualificação] e percebi que não tinha capacidade psicológica para me manter motivado. As pessoas acham que é fácil viajar para o Japão ou Martinica e perder à primeira, em 20 minutos, é muito complicado. Aí comecei a perceber que era melhor afastar-me deste tipo de competição, onde tens de manter constante pica e motivação, foquei-me mais no lado freesurf. Neste momento olho para a competição como um sítio onde posso tirar prazer e mostrar que ainda existo, ainda faço surf, não é por não fazer o QS que deixo de surfar. Serve para provar a mim mesmo que o meu surf está ao nível deles, já provei o que tinha a provar na minha carreira júnior. Sou mais feliz assim.

Nem todos têm de ser surfistas de competição...

O Vasco e o Kikas são felizes, estão a lutar pelo seu sonho. Não podemos ser todos iguais, só um ou dois é que conseguem. Acho que cada um deve seguir o seu caminho, à sua maneira. Todos querem uma carreira no surf, mas infelizmente, como as coisas estão hoje em dia, num milhão de surfistas em Portugal só um ou dois é que vão conseguir fazer disso carreira e ganhar dinheiro. Percebi isso e tomei um rumo diferente. Agora, se me dá pica ir ao nacional? Sem dúvida!

A nível de projetos, o que tem feito? O que aconteceu ao "Jervis and Vagabonds" [uma competição de vídeos de surf]?

Este ano tive de parar o "Jervis and Vagabonds", mas à partida será retomado, e melhor ainda do que já foi. Fiz o "Free Livin"" o ano passado durante a etapa mundial de Peniche. Foram dois episódios que retratam o surf para além da competição, as pessoas acham que somos umas máquinas e não é bem assim, acho que somos até mais parvos do que as pessoas normais. Tiveram óptimo feedback, aquilo transmite exatamente o que somos no dia-a-dia. Agora estou focado no lançamento do meu vídeo, que ando a filmar há um ano e meio. No mês de junho vou começar a editar com a ajuda do Nuno Bandeira. Estou a trabalhar no sentido de fazer um lançamento em grande. Selecionei o melhor dos melhores, é só filmado em Portugal, e estou com as expectativas muito elevadas. Tem um conceito diferente do normal, não é só surf. O objetivo não é só focar nos aéreos, tem tubos, manobras. Convém mostrar que tenho o pacote todo, sou um surfista cheio de manobras.