25 novembro 2017 às 00h11

O campeão de esqui que quis seguir as pisadas de Modric

Foi com as chuteiras que o pai lhe trouxe dos EUA que Krovinovic começou a jogar futebol. Em criança já exibia o talento que levou Rui Vitória a dar-lhe a titularidade

Carlos Nogueira

Filip Krovinovic está numa fase de afirmação como titular da equipa do Benfica, depois de uma pré-temporada difícil, por ter sido submetido a uma intervenção cirurgia para debelar uma pubalgia. Aos 22 anos, este médio croata começa a dar nas vistas, tendo mesmo levado o treinador Rui Vitória a mudar de sistema tático para que pudesse entrar no onze. Isto depois de há pouco mais de dois anos ter chegado como um ilustre desconhecido a Portugal para jogar no Rio Ave.

O médio do Benfica é um autêntico filho da guerra da Independência da Croácia, que terminou em novembro de 1995, três meses depois de Filip ter nascido em Zagreb. O pai Jasenko Krovinovic esteve mesmo envolvido no conflito como membro do exército croata, do qual é agora coronel.
Marjan Sisic, amigo e representante do futebolista na Croácia, admite mesmo ao DN que "Filip teve uma educação diferente das outras crianças em Zagreb, pois criou hábitos diferentes". Ainda assim, Tomislav Krovinovic, irmão três anos mais velho de Filip, garante que "não foi uma educação rígida, mas havia regras, que ele procurava muitas vezes driblar, sempre com um sorriso matreiro".

A estrutura familiar do atleta é bastante elogiada por António Araújo, empresário responsável pela vinda do médio para Portugal. "É uma família muito sólida, pois o pai, a mãe e o irmão acompanham-no muito de perto, estão conscientes do projeto de vida que o Filip tem. Fizeram questão de estar com ele em Portugal nos primeiros tempos em Vila do Conde e estão sempre presentes", revelou o agente.

A ligação da família Krovinovic ao nosso país começou até antes de Filip chegar ao Rio Ave. É que Tomislav fez Erasmus em Aveiro, razão pela qual deu as melhores indicações ao irmão sobre a vida em Portugal. "Quando surgiu a possibilidade de ir para o Rio Ave, aconselhei-o a ir porque além de ser um bom país, a liga é muito boa . Garanti-lhe que iria gostar muito do futebol em Portugal, porque a atmosfera em torno dos jogos é fantástica e nada tem a ver com a Croácia", assumiu o irmão, reconhecendo que o feitio sociável de Filip foi decisivo na adaptação ao nosso país: "Está sempre a sorrir, bem-disposto e a contar piadas." Aliás, Marjan Sisic revela mesmo que cada vez que o médio regressa a Zagreb "é quase impossível falar com ele porque está sempre a visitar os muitos amigos que tem".

As botas que vieram dos EUA

Como muitos miúdos, Filip Krovinovic começou a jogar futebol na rua com os amigos. "Devia ter uns seis anos e já se destacava dos outros", revela Tomislav. Até que a determinada altura quis jogar mais a sério e ingressar num clube. "O nosso pai só autorizava desde que ele tivesse umas botas. Acabou por comprar-lhas numa viagem que fez aos Estados Unidos", conta.

Filip estava autorizado a tentar a sua sorte no futebol. Jasenko foi então com o filho mais novo ao Lokomitiva Zagreb, onde Krovinovic começou a jogar mais a sério. Só que "poucos dias depois chegou a casa a dizer que não queria jogar mais, não queria fazer os exercícios, só queria jogar à bola", conta Tomislav. O problema foi resolvido com uma conversa entre Filip, o pai e o treinador.

Aos 12 anos mudou-se para a academia do Dínamo, o principal clube da Croácia, onde só esteve dois anos, pois ele e Pjaca, atual extremo da Juventus, foram dispensados. "Talvez tenha sido por ser fisicamente mais fraco, mas acho que houve outras razões", garante Tomislav. Seguiu-se o NK Zagreb, onde se destacou nas camadas jovens de tal forma que aos 18 anos foi lançado por Miroslav Blazevic na II Divisão, ajudando a equipa a subir de escalão. Na época seguinte, brilhou entre os grandes, contabilizando 36 jogos, três golos e oito assistências.

"O treinador reconheceu as qualidades dele e apostou no Filip, que acabou por ser um dos melhores jogadores do campeonato. A partir desse momento deixei de ter dúvidas que ele chegaria onde quisesse no futebol", adianta Marjan Sisic. Esse talento era evidente desde criança, como o revela um episódio contado pelo irmão: "Aos oito anos, ele já marcava os livres e um dia o treinador obrigou-o a marcar de pé esquerdo, ele não queria, mas fez golo logo à primeira tentativa."

Houve, no entanto, um momento, aos onze anos, em que Filip Krovinovic poderia ter trocado o futebol... pelo esqui. "Nós costumávamos ir de férias para a Áustria e um ano ele começou a aprender a fazer esqui, no ano seguinte entrou numa competição e sagrou-se logo campeão", conta Tomislav, revelando que o irmão "sempre foi bom em todos os desportos que praticou, até no basquetebol se destacava". Contudo, a paixão pelo futebol foi sempre mais forte e o des porto rei acabou mesmo por vingar.
Perdeu-se um economista

Tomislav revela ainda ao DN que o irmão sempre foi "um bom aluno", chegando a matricular-se na universidade, no curso de economia, quando estava no NK Zagreb. "Foram apenas sete ou oito meses, mas depois acabou por desistir porque não conseguia conciliar com o futebol com os estudos", explicou, admitindo que foi uma boa decisão: "Ele é muito melhor jogador do que seria economista."

Nessa altura, já Filip Krovinovic tinha como ídolo Luka Modric, médio croata que é uma das estrelas do Real Madrid. "O sonho dele é chegar ao mesmo patamar... aliás, até no jeito do penteado se vê que ele procura imitar o Modric", atira António Araújo.

Tomislav conta mesmo que o irmão "costuma ver os jogos" do jogador do Real Madrid com toda a atenção para "tentar aprender os seus movimentos". Contudo, o médio está sempre à procura de evoluir, segundo garante o irmão: "Desde que está no Benfica tem aprendido bastante com Pizzi, mas também com Jonas ou Salvio."

Krovinovic já leva oito jogos pelo Benfica esta temporada (cinco no campeonato, dois na Taça de Portugal e um na Taça da Liga) e um golo apontado, precisamente na Taça, na vitória por 2-0 sobre o Vitória de Setúbal, a 18 de novembro. O facto de ter sido operado a uma hérnia enguinal durante a pré-época, aliado ao facto de o Benfica ter inscrito na altura Mile Svilar devido aos problemas físicos de Júlio César e ter ocupado uma das vagas de estrangeiros com Gabriel Barbosa, levou os responsáveis encarnados a não inscreveram o médio croata na Liga dos Campeões.

Certo é que na atualidade Krovinovic parece ter ganho um lugar no onze de Rui Vitória, pois nos últimos dois jogos (V. Guimarães para o campeonato e V. Setúbal para a Taça) foi titular e atuou os 90 minutos. Aos 22 anos, o médio com tiques de Luca Modric quer impôr-se no Benfica e, quem sabe, poder num futuro próximo chegar mais longe.