Nuno Lopes: "Agrada-me trabalhar em elencos com pessoas de várias nacionalidades"  

A Prime Video acaba de estrear a sua primeira série luso-espanhola. Operação Maré Negra baseia-se em eventos reais, de 2019, e tem no elenco portugueses como Lúcia Moniz e Nuno Lopes, ele que falou com o DN sobre a importância de uma coprodução como esta.

Se há ator que está em todas é, definitivamente, Nuno Lopes. Da série White Lines, da Netflix, à mais recente Causa Própria, da RTP1, passando pela brincadeira refrescante de Bruno Nogueira, Princípio, Meio e Fim, da SIC, o seu currículo durante a pandemia foi um luxo televisivo. Mas se lhe perguntarmos o que andou a fazer no último ano, a resposta é... cinema. Filmes ainda por estrear. Algures pelo meio entrou noutra minissérie, Operação Maré Negra, uma coprodução entre Espanha e Portugal (Ukbar Filmes) que carrega o simbolismo de ser a primeira no streaming da Prime Video. Quando começamos a entrevista, via Zoom, a propósito desta última, faz questão de pôr os pontos nos is: "Uma coisa é cinema, outra coisa é entretenimento - as séries são entretenimento. O que não impede que sejam bem feitas e tenham qualidade. São linguagens diferentes. Eu sou a favor da diversidade. Acho que há lugar para todos, desde que ninguém deixe de ter lugar, ou seja, desde que o facto de haver séries e filmes no streaming não faça com que se perca o lado autoral do cinema. E não me parece que se esteja a perder."

Com esta confiança, Nuno Lopes foi na onda da irmandade ibérica do projeto. Operação Maré Negra inspira-se em acontecimentos de novembro de 2019, quando um submergível atravessou o Oceano Atlântico com uma carga de três toneladas de cocaína e três homens lá dentro, sujeitos a todo o tipo de infortúnios, mais a coação da polícia. O protagonista é o espanhol Álex González, que interpreta um jovem galego, campeão de boxe amador, envolvido com malta da pesada depois de um trabalho que não corre bem... Ele só estava a tentar ganhar a vida. Com a corda ao pescoço está também o seu melhor amigo, a personagem de Nuno Lopes, que no primeiro dos quatro episódios passa quase o tempo todo a "curtir a vida".

Ao receber o guião, o ator interessou-se logo pelo fator do caso verídico em si, "porque obriga a pensar qual seria a história destas pessoas que atravessaram o Atlântico dentro de um submarino cheio de coca, que ainda por cima era uma construção rudimentar e artesanal!" Mas há mais motivos: "Interessa-me sempre muito explorar a relação com outros países. Agrada-me cada vez mais a ideia de trabalhar em elencos mistos, com pessoas de várias nacionalidades, e este tem espanhóis, portugueses e até brasileiros."

Entre os portugueses, Lúcia Moniz é outro rosto em destaque na série. Ela interpreta a agente da polícia que une esforços com os colegas espanhóis na vigilância das operações criminosas em curso na Galiza. Um lugar limítrofe que é essencial para se perceber o sentido desta coprodução. Nuno Lopes considera a fronteira uma criação mental: "Tenho uma relação muito pouco realista com as fronteiras. As fronteiras existem sobretudo nas nossas cabeças. Por exemplo, as pessoas no norte, que vivem perto de Espanha, às vezes têm muito mais parecenças e amizades com as pessoas do outro lado da fronteira do que com pessoas do sul de Portugal, e o mesmo do outro lado, com os espanhóis [da Galiza] em relação a Barcelona, suponhamos. Portanto, parece-me natural que uma história que se passa na fronteira com Portugal mostre essa relação próxima entre os dois países. A série espelha uma realidade concreta." Uma realidade que ele sentiu na primeira pessoa: "Nunca tinha estado na Galiza mais do que um dia, e o que percebi é que estar a filmar nessa região não é assim tão diferente de estar a filmar no norte de Portugal. Senti-me em casa, de certa maneira. Mais uma vez, não acredito na fronteira como um sítio onde começa uma coisa totalmente diferente, até porque os espaços geográficos, neste caso, são muito parecidos. E penso que é importante existirem séries como esta que falem desse espaço que é partilhado pelas duas nações."

Para Nuno Lopes, a existência de Operação Maré Negra vem dar resposta a uma necessidade de ir mais longe naquilo que tem sido a tendência de internacionalização dos atores portugueses. "Nós sempre tivemos, e vamos continuar a ter, realizadores, técnicos e atores capazes de sair de Portugal e com qualidade suficiente para trabalhar lá fora. O que acho que nos falta ainda é uma relação de produção exterior a Portugal. E quando essas apostas começarem a vingar, vai haver outro tipo de partilha de histórias. Foi esse o passo dado pela Operação Maré Negra", sublinha.

Com filmes de João Canijo (Mal Viver), Marco Martins (Great Yarmouth - Provisional Figures), Tiago Guedes (Restos), e duas produções francesas a estrear nos próximos tempos, o ator imparável e camaleónico não se compromete com registos específicos mas namora qualquer um, respeitando a singularidade de cada projeto: "Uma das coisas que me agrada como ator é poder fazer hoje uma peça de teatro do Beckett para 10 pessoas, amanhã uma série internacional comercial e a seguir um filme de autor. Sempre gostei, não só de mudar de personagem, mas também mudar de projeto e do tipo de atitude que se tem para com o projeto. Isso é algo que continua a desafiar-me, e no fundo é o que eu procuro." Eis uma possível definição do ator completo.

dnot@dn.pt

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