Cultura
25 julho 2021 às 22h18

"Gostava de ser mais leitora e mais escritora (e já agora mais nova)"

A editora e escritora Maria do Rosário Pedreira responde ao famoso Inquérito de Proust.

Maria do Rosário Pedreira

A sua virtude preferida?

A bondade; citando Adília Lopes, "se não forem pessoas boas, não prestam".

A qualidade que mais aprecia num homem?

A de não ter vergonha de chorar: na morte, em filmes lamechas e quando a bandeira de Portugal é hasteada ao som do hino.

A qualidade que mais aprecia numa mulher?

São duas: a capacidade de guardar um segredo (segundo a minha estatística, muito mais rara numa mulher do que num homem) e a lealdade.

O que aprecia mais nos seus amigos?

O facto de nunca me cobrarem as longas ausências nem se esquecerem de mim por causa delas.

O seu principal defeito?

A impaciência em tudo: ler as instruções de um electrodoméstico, abrir uma embalagem, falar ao telefone com pessoas armadas em Proust, esperar que chegue a minha vez de ser atendida.

A sua ocupação preferida?

Ler, de preferência ao lado de alguém que faça o mesmo e não interrompa para comentar.

Qual é a sua ideia de "felicidade perfeita"?

Se já põem a expressão entre aspas, como querem que eu acredite nela?

Um desgosto?

Mortes que não saram. Medo de que morram os vivos que amo. Uma sensação muito real de haver cada vez mais moribundos entre os vivos que por aí andam.

O que é que gostaria de ser?

Mais leitora e mais escritora (e já agora mais nova), menos trabalhadora e menos preocupada. Em suma: alguém com mais tempo e outra disposição para fazer aquilo de que gosta.

Em que país gostaria de viver?

Neste, mas com melhor educação, melhores cuidados de saúde, mais dinheiro para a Cultura, menos pobres, maior respeito pelo Outro.

A cor preferida?

O azul da Ericeira, o verde do Sporting, o branco-pérola com que a minha mãe ainda pinta as unhas aos 96 anos.

A flor de que gosta?

Os girassóis de Van Gogh, as papoilas de Monet, os jarros, as íris e os hibiscos de Georgia O"Keefe... As flores verdadeiras (tenho pena) fazem-me espirrar.

O pássaro que prefere?

O beija-flor, porque pode meter o nariz onde eu não posso.

O autor preferido em prosa?

Não lhe chamaria exatamente a minha preferida, mas foi ela que me ensinou que a literatura podia ser outra coisa: Marguerite Duras.

Poetas preferidos?

Não queriam mais nada...

O seu herói da ficção?

Robin dos Bosques!

Heroínas favoritas na ficção?

As minhas preferidas são todas anti-heroínas...

Os heróis da vida real?

Cristo, Ghandi, Mandela e o meu irmão Jorge, que se vira do avesso e anda sempre estafado, mas nunca nos falta.

As heroínas históricas?

Escrevi um livro sobre algumas delas, chamado Portuguesas Extraordinárias: Leonor de Avis, Marquesa de Alorna, Beatriz Ângelo, Catarina Eufémia, Amália Rodrigues...

Os pintores preferidos?

Tudo muito óbvio: Clara Peeters, Vermeer, Max Ernst, Magritte, De Chirico, Amadeo, Edward Hopper... Ah, e Alfred Stieglitz com as suas maravilhosas fotografias de nuvens.

Compositores preferidos?

Piazzolla, Mozart, Chico Buarque, Steve Reich, Paul Simon, Alain Oulman, Gershwin, Bach, Eleni Caraindrou, ui... isto nunca mais acabava.

Os seus nomes preferidos?

Pedro, como a primeira pedra.

O que detesta acima de tudo?

Cinismo, mentira, falsidade. (E confesso que fico doente quando me mudam os planos à última hora.)

A personagem histórica que mais despreza?

Qualquer genocida serve.

O feito militar que mais admira?

O 25 de Abril, pois claro.

O dom da natureza que gostaria de ter?

Voar como uma águia, mas também ser mosquinha...

Como gostaria de morrer?

Sem dar por isso.

Estado de espírito atual?

De missão cumprida (só faltam duas perguntas e as mais difíceis já estão despachadas).

Os erros que lhe inspiram maior indulgência?

Nunca fui grande coisa a perdoar.

A sua divisa?

Deitar-me todas as noites de consciência tranquila.