Cultura
07 julho 2022 às 06h22

Concerto morno dos The Strokes deu lugar ao verdadeiro espetáculo: Stromae

Os concertos do palco NOS (o principal) foram desde a pop eletrónica dos Jungle à melancolia das guitarras dos The War on The Drugs. Os cabeças de cartaz The Strokes não maravilharam e deram lugar, na hierarquia do melhor concerto, ao belga Stromae, que foi quem brilhou na primeira noite do NOS Alive edição de 2022.

Inês Dias e Rui Miguel Godinho
Inês Dias e Rui Miguel Godinho

Vestidos a rigor para dar início à "festa" do NOS Alive, os sete membros dos Jungle encheram o gigante palco NOS e deixaram o público leve e a dançar desde o momento em que pisaram o palco.

8 anos depois da estreia da banda britânica no NOS Alive (ainda no palco Clubbing, na edição de 2014), os Jungle regressaram num ambiente bem-disposto e jovial para trazer o soul ao primeiro dia de festival.

Entre os vários "obrigados" que se faziam ouvir num sotaque britânico entre as músicas, Josh Lloyd Watson e Tom McFarland brindavam ao público português com garrafas de sidra, num fim de tarde que relembrava uma festa de verão entre amigos. "Vocês são lindos", diziam.

Com The Heat, Josh desafiava: "Esta é a parte do espetáculo em que nos começamos a soltar". E em Happy Man, Smile e Casio - com a melodia de Stayin" Alive dos Bee Gees - já se ouviam vozes que entoavam as letras das canções.

Numa harmonização entre vozes femininas e masculinas que davam visibilidade a todos os membros do grupo, houve ainda tempo para o mais recente single Good Times, lançado apenas no mês passado.

Para a despedida ficou a conhecida Busy Earnin", num "adeus" que promete ser um "até já".

Foi por volta das 21h00 que o Passeio Marítimo de Algés começou a ganhar cor quando subiram ao palco The War on Drugs ao som do tema Old Skin.

Durante uma hora de espetáculo bastante calma - com espaço para apenas nove canções - muitos dos festivaleiros aproveitaram para visitar os restantes palcos ou stands que o festival oferecia. Para um público um tanto desanimado, a melancolia das canções da banda norte-americana fizeram ponte entre a animação de Jungle e The Strokes.

E assim, num concerto de poucas palavras, a música rock reinou tendo como complemento o típico pôr do sol que espreitava por trás do palco NOS Stage. I Don"t Live Here Anymore (2021), A Deeper Understanding (2017) e Lost In The Dream (2014) foram os álbuns que mereceram destaque no alinhamento deste segundo concerto da banda em Portugal.

Já perto do final, Strangest Thing foi a balada que voltou a encher o palco principal. Durante 6 minutos a banda de Adam Granduciel mostrou ser merecedora de tanto sucesso com solos de guitarra que conquistaram até os mais distraídos. Mas foi com Under the Pressure e I Don't Live Here Anymore que The War on Drugs elevaram a fasquia e se despediram de um público já muito animado e pronto para uma longa noite.

18 minutos depois da hora marcada (22h30), os The Strokes subiram ao palco do NOS Alive. Depois do concerto anterior - em que a banda foi criticada pela fraca prestação - a expectativa para ver o quinteto liderado por Julian Casablancas estava em alta, e a banda correspondeu, logo a abrir, surpreendendo tudo e todos e estreando Is This It? nesta digressão. Seguiu-se The Adults Are Talking, com o público a responder às doses de energia que lhes eram solicitadas.

Mas não sem antes haver um percalço. De colete camuflado e óculos de sol, Casablancas não tranquilizava a plateia, deixando cair o microfone acidentalmente - "Drunk again, sorry" ("Bêbedo de novo, desculpem"), dizia ao público.

Perante uma plateia bem composta, mas longe de estar esgotada (e onde estava o ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva), os norte-americanos iam mudando o alinhamento dos concertos recentes e, com isso, as expectativas para um eventual descalabro dissipavam-se. Apesar dos momentos balbuciantes de Casablancas na maior parte das vezes que, entre as músicas, se dirigia ao público, surpresas não faltaram. Exemplo maior disso foi a homenagem à artista Clairo (que, durante a tarde, confirmara a sua ausência no Palco Heineken devido a ter tido o voo entre Milão e Lisboa cancelado).

"Soubemos que a Clairo teve de cancelar o concerto. É pena. Estivemos a ensaiar isto no backstage", disse o vocalista dos The Strokes à plateia antes de partir para um cover de Sofia, canção da artista.

Aquilo que se pedia aos The Strokes era simples: um concerto compacto, visto que a seguir ainda atuava Stromae. Essa objetividade podia ter acontecido não fossem os silêncios prolongados entre as canções do alinhamento ou as rábulas de Casablancas (onde não faltaram muitos "oh yeah", "isto é muito bonito, vocês são bonitos" e até algumas piadas privadas entre a banda). No entanto, o público não afrouxou e até ia respondendo bem à grande maioria dos êxitos que os norte-americanos trouxeram na bagagem até Algés. Se canções como Selfless soltaram um cantarolar mais tímido a quem assistia, houve momentos para cantar a plenos pulmões em canções como Hard to Explain ou Reptilia.

Para o encore estavam guardadas três canções - You Only Live Once, Selfless e Juicebox -, todas elas tocadas de rajada. "Obrigado por estarem aí. O concerto foi bom por vossa causa e vocês foram uma boa plateia", dizia Casablancas antes da última canção da noite, que se revelou um fim um tanto ou quanto anti-climático para a cerca de uma hora que estiveram em palco - quando a poucos metros dali, num palco Heineken começavam os Parov Stelar a dar a sua "festa" correspondida com uma enchente.

Voltando à banda de Casablancas, depois de autênticas tragédias em concertos anteriores em solo nacional, o desta quarta-feira não foi certamente o grande concerto que se espera que os The Strokes, ainda possam vir a dar por cá. Mas quem assistiu ao espetáculo não pode dizer que saiu defraudado. Até porque depois do caos de Roskilde, na Dinamarca, pedia-se competência e isso não faltou aos norte-americanos.

Vindo da Bélgica, Paul van Haver (nome artístico Stromae), chegou ao palco principal do NOS Alive já bem perto da 1h da manhã. Apesar da hora tardia e do lugar no cartaz quase em jeito de after-party, o desafio de chamar gente podia não ser fácil. Mas o belga respondeu e, ao fim de duas músicas, já tinha posto o público português a dançar.

Num português irrepreensível, Stromae perguntava: "Boa noite, Lisboa. Tudo bem?", o público respondia e era certo: estava mesmo tudo bem. "Vamos tocar músicas mais recentes e outras mais velhas", justificou-se. Mas o público não tinha problemas com isso: importava era dançar os ritmos eletrónicos do cantor francófono.

Depois de uma entrada a abrir (com Invaicu e Tous Les Mêmes), o momento mais contemplativo da noite chegou com Mauvaise Journée, com o compositor belga a refastelar-se num sofá mecânico que ia percorrendo o palco, enquanto refletia sobre a solidão e a depressão, sob uma iluminação envolvente que dava um ambiente diferente ao palco. Com Bonne Journée, o ambiente voltou a animar-se e Stromae preparava o público para o que aí vinha: o primeiro grande êxito da noite.

Solicitando a ajuda de um cão robô que trazia um casaco diferente, o belga perguntava: "Sabem o que significa esta roupa significa, certo?", a resposta foi afirmativa. Papaoutai foi, talvez, o primeiro momento da noite em que toda a plateia cantou em uníssono as palavras escritas por van Haver - algo que, antes do encore, só se deve ter repetido com Formidable, outro dos hits do belga.

Com um alinhamento em modo expresso (de apenas pouco mais de uma hora), L"Enfer mostrou, mais uma vez, a atenção aos detalhes e, no fundo, num ecrã LED, apareciam colunas de fumo infernais que refletiam as palavras que Stromae ia cantando.

E, para terminar a noite com chave de ouro, não podia faltar o êxito que catapultou o compositor para o estrelato. Alors on Dance surgiu então no encore, com toda a gente a dançar e a saltar à medida que, no palco, Stromae também fazia a festa com os quatro músicos que o acompanhavam, lembrando que esta canção viralizou na plataforma TikTok, replicando depois a coreografia das danças na rede social.

O segundo dia do NOS Alive decorre esta quinta-feira com o palco principal (palco NOS) a ter Florence + The Machine, Alt-J e Jorja Smith como nomes principais.

ines.dias@dn.pt

rui.godinho@dn.pt