Cidades
07 dezembro 2019 às 20h13

Ativistas pedem para não mudar Feira da Ladra. Câmara fala em "campanha de desinformação"

A guerra já dura há, pelo menos, mais de um ano. Apesar da constante negação da autarquia, a Stop Despejos diz ter razões para acreditar que está nos planos da Câmara Municipal de Lisboa mudar a Feira da Ladra de Lisboa de local. O coletivo esteve na manhã deste sábado em protesto.

Não foi apenas mais um dia na famosa Feira da Ladra de Lisboa, que há 137 acontece todas as semanas neste bairro histórico da Graça. Este sábado de manhã, um grupo de pessoas da Stop Despejos, um coletivo em defesa do direito à habitação, invadiu o recinto. Chegaram com máscaras de Fernando Medina, presidente da Câmara Municipal de Lisboa (CML), sobre o rosto, e com cartazes ao peito: 'Lisboa não está à venda!'. Tornavam público um manifesto sobre a suspeita de que a autarquia pretende mudar os feirantes para a Expo ou até para o Beato. Não passa de "uma informação que, recorrentemente, aparece sob a forma de uma verdadeira campanha de desinformação", garante fonte da autarquia.

O caso remonta a 2018. Pelas redes sociais, começaram a circular rumores de que a Feira da Ladra seria transladada para outra zona da cidade, conta a Stop Despejos numa carta aberta. Perante as suspeitas de vários cidadãos, a 26 de outubro de 2018, a Câmara Municipal de Lisboa escreveu na sua página de Facebook que "não há nenhum plano ou intenção de fechar, condicionar ou mudar de local a Feira da Ladra, conforme vem sendo referido, erradamente, em algumas contas das redes sociais". "É a feira mais antiga da cidade e vai continuar, nos mesmos moldes e sem qualquer alteração, onde está desde 1882", reiteravam.

Não convencida da posição da autarquia, mais de um ano depois a Stop Despejos saiu à rua para protestar. De acordo com o coletivo, há "sinais" suficientes para o fazer. A começar pelo panorama internacional: "um pouco por todo o mundo, feiras como esta têm sido deslocadas para a periferia ou encerradas por não se ajustarem aos interesses das políticas neoliberais que governam as grandes cidades e são responsáveis por processos de gentrificação". E é esta "gentrificação brutal a que a cidade de Lisboa foi submetida nos últimos anos" que os faz acreditar que a mudança da feira centenária para outro local "é uma realidade bem possível", lê-se no documento do coletivo ao qual o DN teve acesso.

"Lisboa não está a venda. A Feira da Ladra é de todos nós!", escreviam esta tarde na sua página de Facebook. O coletivo denuncia que o trabalho dos vendedores "tem sido alvo de processos recentes de higienização por parte das instâncias superiores da Câmara Municipal de Lisboa". Referem-se, por exemplo, a uma parte do antigo Hospital da Marinha (que "acolherá um complexo de hotelaria, comércio e habitação de luxo"), junto à feira, sobre a qual se "levantam hipóteses entre os vendedores de os proprietários" de que a empresa que comprou o edifício (Stone Capital) "pretende usar essa parte para construir o parque de estacionamento frente ao seu projeto de luxo", diz na carta aberta divulgada.

Questionada pelo DN, fonte da Câmara Municipal de Lisboa volta a negar que a mudança da Feira da Ladra para outro local esteja em risco. "À semelhança do que já fez há [cerca de] dois anos, a Câmara Municipal de Lisboa reitera que não há nenhum plano ou intenção de fechar ou mudar de local a Feira da Ladra, conforme vem sendo referido, erradamente, em algumas contas das redes sociais e noutros contextos."

Mas a Stop Despejos exige um comunicado oficial sobre o assunto. "A CML tem o dever de informar, consultar e ouvir os cidadãos, e não é com comunicações no Facebook que cumpre estes deveres. A CML não se pode limitar a 'soprar sobre o fogo'. Exigimos transparência e um processo democrático de decisão", frisam.

Não foi no Campo de Santa Clara, no bairro da Graça, que esta feira começou. A sua história remonta aos séculos XII e XIII, no bairro do Castelo, quando ainda era chamada Mercado Franco de Lisboa e como atualmente o conhecemos - uma feira de artesanato e de objetos usados. Era, afinal, um mercado como todos os outros, com venda de produtos alimentares. Entretanto, passou ainda pelo Rossio, pela Praça da Alegria e pelo Campo de Sant'ana. E só chegaria ao atual local em 1882, já nos traços que hoje lhe são característicos.