Rose McGowan denuncia abusos de Hollywood e não se vai calar
A atriz acusa Harvey Weinstein de a ter violado em 1997 e vai mais longe nas suas acusações na autobiografia "Brave" e no documentário "Citizen Kane" que passa amanhã no canal E!
"O Monstro." É assim que a atriz Rose McGowan se refere a Harvey Weinstein no seu livro de memórias, Brave, que acaba de ser publicado nos Estados Unidos. Nunca diz o nome do produtor de cinema e televisão, ex-patrão da Miramax, que acusa de a ter violado em 1997. O seu caso tornou-se público apenas em outubro de 2017, quando o jornal The New York Times revelou que McGowan era uma das vítimas dos lastimáveis comportamentos de Weinstein (neste momento são já 84 as mulheres que se queixam dele). E agora, depois de 20 anos a não ser levada a sério, McGowan está finalmente a conseguir fazer-se ouvir. De todas as maneiras possíveis.
Em outubro esteve na Convenção das Mulheres, que reuniu milhares de mulheres em Detroit; em dezembro estava na capa da Time como uma das pessoas do ano, envolvida no movimento #metoo; e na semana passada lançou o livro autobiográfico Brave. Entretanto, produziu e realizou uma espécie de documentário em estilo reality show intitulado Citizen Rose (Cidadã Rose) que hoje chega a Portugal através do canal E! (mais quatro episódios estão prometidos para os próximos meses).
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Aí, Rose McGowan conta como conheceu "O Monstro" na apresentação do filme Going all the Way Down, no Festival de Cinema de Sundance em 1997. Ela tinha 23 anos. Weinstein convidou-a para irem a um restaurante para discutirem o futuro da sua carreira. Mas, após meia hora, ele levou-a para o quarto de hotel e, quando ela tentou ir-se embora, ele forçou a ir para o jacuzzi e fez-lhe sexo oral enquanto se masturbava.
"Senti-me tão suja. Tinha sido violada e sentia-me profundamente triste", escreveu. Pouco depois, McGowan encontrou o ator Ben Affleck e contou-lhe o sucedido. Ele comentou: "Raios, já lhe tinha dito para ele parar de fazer isso." (isto segundo a versão dela, Affleck nunca corroborou esta história).
Weinstein negou imediatamente todas as acusações e, além do depoimento de Jill Messick, que era a agente da atriz e terá sido a responsável pelo encontro, apresentou ainda em sua defesa três fotografias tiradas em 2005 onde ambos aparecem em poses sorridentes, sugerindo uma amizade. Mas o que Rose McGowan, hoje com 44 anos, tenta dizer, através do livro e do programa de televisão, é que na altura não teve força para combater o produtor mas agora tem.
A atriz começou a escrever Brave há três anos: "Mas de uma certa forma, tenho vindo a pensá-lo ao longo da minha vida toda." No livro, ela conta como cresceu numa família que pertencia ao culto Crianças de Deus, na Itália, que defendia a poligamia, e como a família se mudou para os Estados Unidos quando ela tinha 10 anos. Foram os pais que a incentivaram a tornar-se modelo e atriz. Mas a juventude revelou-se igualmente problemática. Depois do divórcio dos pais, aos 15 anos Rose McGowan emancipou-se e mudou-se para Los Angeles. Durante três anos manteve uma relação com um homem violento e houve alturas em morou na rua. Em 1992, conseguiu o seu primeiro papel num filme de Hollywood. Em 1996 ganhou um Independent Spirit Award para atriz revelação em The Doom Generation, de Gregg Araki.
Este passado terá sido determinante na decisão de não fazer queixa de Weinstein na polícia no momento em que tudo aconteceu. Tinha medo de ficar sem trabalho e de voltar para a rua. "A rua era uma sentença de morte. Sabia que se morresse seria lembrada por ter acusado o seu violador, mas não pelo meu trabalho. Mas denunciou o caso a algumas pessoas e foi constantemente ignorada. Ninguém queria saber.
De então para cá, a atriz diz que o facto nunca deixou de a atormentar, ao mesmo tempo que a "máquina de Hollywood" insistia em sexualizar a sua carreira, com papéis em que constantemente tinha de expor o corpo. A atriz acusa vários homens do meio cinematográfico - incluindo os realizadores Robert Rodriguez (com quem manteve uma relação) e Quentin Tarantino - de misoginia e de abusarem psicologicamente dela. Foi contra tudo isto que começou a falar há uns anos. Foi uma das primeiras a fazê-lo. E também por isso foi contactada pelos advogados de Harvey Weinstein que lhe ofereceram dinheiro em troca do silêncio. "Nem tenho palavras para explicar como estou zangada", diz, logo no início de Citizen Rose. "E não é só por mim. É por todas as pessoas que foram desacreditadas."