Caixa Alfama contou com 11700 espectadores este ano

No segundo dia o festival de fado encerrou com o concerto de Carminho e contou ainda com atuações de Aldina Duarte, Júlio Resende e um tributo a Fernando Maurício.

Faltavam poucos minutos para os ponteiros do relógio apontarem para as oito da noite quando as pessoas se começaram a sentar pelo chão da Igreja de São Miguel, ocupando os poucos espaços vazios que ainda restavam. Por esta hora a igreja acolhia o fadista José Gonçalez, que apresentou um repertório de cariz religioso ou não estivesse a cantar numa igreja. Adivinhava-se, desde logo, um dia tão agitado quanto o primeiro do festival Caixa Alfama e ao final do segundo dia a suspeita confirmou-se com os números avançados pela organização: 11 700 espectadores passaram este ano por Alfama, ultrapassando os dez mil do ano passado.

No festival provou-se que o fado não vive só de voz e guitarradas. O pianista Júlio Resende mostrou a sua visão dos fados de Amália Rodrigues na esplanada do restaurante do Museu do Fado, iniciando o seu concerto com uma reinterpretação ao piano de Vou Dar De Beber À Dor, à qual se seguiu Gaivota. Em ambos os temas não faltou o cunho jazzístico que caracterizou o início do percurso de Resende na música.

Seguimos até à Sociedade Boa União e no trajeto até lá voltamos a perder-nos pelas ruas do bairro lisboeta, passando sempre por casas de fado e tascas onde a clientela turística dominava. Chegamos ao destino a tempo de ver no palco Caixa Futuro aqueles que poderão ser os fadistas de amanhã, já que neste palco só atuaram vozes com menos de 18 anos. Apesar de muito jovens, não esquecem a história desta canção, como se comprovou com José Luís Geadas, que passou pelos repertórios de Alfredo Marceneiro e Fernando Farinha. Já Diana Vilarinho interpretou versos de Augusto Gil.

A caminho do Centro Cultural Dr. Magalhães Lima cruzamo-nos com uma maratona nocturna que passava pelas ruas de Alfama, realizando-se paralelamente à programação do festival. Dezenas de populares gritavam aos corredores palavras de incentivo, outros lançavam as suas piadas para todos ouvirem: "Entra numa tasca e deixa-te de corridas", gritava um dos populares, envergando uma T-shirt de James Dean.

E se alguém duvidasse que hoje o fado é uma música completamente transversal a nível geracional, precisava de estar pelas dez da noite no centro cultural, onde se realizou um tributo a Fernando Maurício. Ana Maurício, sobrinha do fadista, iniciou a homenagem, tendo ainda partilhado o palco com Luís Duarte. Entre a plateia estavam pessoas de todas as idades, dos mais velhos aos jovens que exibiam com alguma vaidade as suas tatuagens espalhadas pelo corpo e os penteados a imitar os jogadores de futebol mais mediáticos. Outros empunhavam telemóveis e câmaras portáteis para registar o fado que acontecia no palco.

Quando descemos até ao Largo das Alcaçarias para ver Aldina Duarte passamos à porta do Museu do Fado. Na esplanada atuava Filipa Cardoso e a procura era tanta que várias pessoas subiram aos muros para conseguir ver a fadista.

Aldina Duarte afirmou ser um "desafio" cantar num festival como o Caixa Alfama, mas salientou: "Eu canto em qualquer lado". Como a própria confessou, quando canta sente que está a falar directamente com as pessoas e esse impacto emocional foi evidente ao longo da sua atuação no bairro lisboeta. Além de ser arrebatadora enquanto intérprete, um dos melhores trunfos de Aldina Duarte está na escolha dos poemas que são de uma profundidade emocional tal que potenciam ainda mais esta voz que carrega em si todo o peso do fado.

Junto ao rio, coube a Carminho a responsabilidade de encerrar esta segunda edição do festival. "Nem imaginam a emoção que é estar em Alfama, com este mar de gente a cantar numa festa dedicada ao fado", começou por dizer a fadista. Passou por temas dos seus dois álbuns já editados - Fado, de 2009, e Alma, de 2012 - e mostrou uma vez mais como é uma intérprete distinta quando agarra os fados tradicionais. Como a cantora afirmou durante o espetáculo, "o fado pode ser trazido do passado, mas é sempre atual".

A fadista recordou a sua íntima vivência no bairro de Alfama onde a sua mãe, Teresa Siqueira, teve uma casa de fados. "Aprendi muito com as pessoas daqui, com os fadistas, mesmo os que não cantam são muito fadistas", disse.

Devido a esta ocasião especial, Carminho guardou para o final da sua atuação um novo fado que fará parte do seu terceiro álbum de estúdio, que tem vindo a preparar durante as últimas semanas. O fado menor do Porto, com letra de Reinaldo Ferreira, só confirmou o talento da fadista.

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