02 dezembro 2016 às 00h52

Mestre da viola campaniça, Pedro leva o cante às crianças

Pedro Mestre venceu o Prémio Carlos Paredes 2016, que receberá amanhã, com o disco "Campaniça do Despique". O músico que resgatou a campaniça ao esquecimento e lhe deu um futuro, leva ainda, desde 2006, o cante às escolas alentejanas

Mariana Pereira

Pedro Mestre tinha 11 anos quando ouviu pela primeira vez o som da viola campaniça, tocada "pelo senhor Manuel Bento e o senhor Francisco António", em Castro Verde, no distrito alentejano de Beja. E foi o que bastou para resgatar ao esquecimento um instrumento que, sem sangue novo, desapareceria. Aprendeu a tocá-lo e a construí-lo, visto que a viola estava praticamente extinta. Hoje com 33 anos, o alentejano da Aldeia da Sete, Castro Verde, ensinou as técnicas de construção a luthiers do país inteiro e fora dele, como no Brasil, e o seu projeto Cante nas Escolas abrange hoje milhares de crianças alentejanas que, quando agora ouvem o som da campaniça ou as vozes do cante, sabem que estão em casa.

Galardoado agora com o Prémio Carlos Paredes 2016 pelo seu disco Campaniça do Despique (2015), que receberá amanhã às 21.30 no Centro Cultural Bom Sucesso, em Alverca do Ribatejo, atribuído pela Câmara Municipal de Vila Franca de Xira, Mestre lembra: "Eu nunca conseguirei sair da tradição, nem quero. É aquilo que eu gosto fazer e quero mostrar às pessoas. Mas é importante inovar também. Não sou nem quero ser purista. Não posso esquecer nunca os meus mestres, que desde cedo me incentivaram e aceitaram a evolução dos tempos." Foi inovando, aliás, que conseguiu "cativar os jovens" para a tradição, explica.

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O projeto Cante nas Escolas, para o primeiro ciclo de escolaridade, surgiu em 2006. "Sob a minha responsabilidade tenho para cima de 800 alunos. Os colegas que estou a coordenar, outros monitores de cante, têm três mil, três mil e quinhentos alunos. Foi necessário formar mais monitores, a maioria deles tem vinte e poucos anos. A situação inverteu-se: hoje são os jovens que ensinam as crianças."

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Hoje, acrescenta, "temos crianças conhecedoras daquilo que existe. O cante está vivo e faz-se cante todos os dias." Como viva está a viola campaniça, que tradicionalmente se toca no vai e vem do polegar pelas cordas, embora ele por vezes use os cinco dedos. "Vai surgir em Castro Verde, dentro de pouco tempo, um espaço dedicado à viola campaniça: com centro de documentação, museu, escola de música, escola de construção do instrumento, um auditório", anuncia Pedro Mestre. Quanto a uma eventual candidatura do instrumento a Património da Humanidade da UNESCO, como é hoje o cante, o músico acredita que esta faria sentido numa candidatura conjunta das violas dedilhadas, de arame, tradicionais portuguesas. Entre as quais estão "outras menos tocadas e faladas, que precisam de ser ajudadas, como a viola toeira, a viola beiroa..."

Por fim, Mestre deixa o aviso: para o ano, há novo disco e um DVD do concerto de 2015 no Centro Cultural de Belém.