Uma comédia sobre a vontade que os franceses têm de viver a reforma em Portugal

Os encontros do Cinema Francês em Paris apresentaram as novidades. <em>Joyeuse Retraite</em>, uma comédia sobre a moda dos franceses apostarem na reforma em Portugal, e<em> Os Tradutores</em>, com Maria Leite, estão entre as grandes apostas para 2020.
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Há um cheiro português na próxima leva do cinema francês e isso nota-se na apresentação que a UniFrance apresentou à imprensa internacional e a distribuidores de todo o mundo sobre os próximos filmes franceses previstos para as salas de cinema. Esse apelo português aparece em Os Tradutores, um thriller com Lambert Wilson, onde a atriz Maria Leite é uma das protagonistas femininas e também em uma Reforma Alegre (Joyeuse Retraite), uma comédia popular com Thierry Lhermitte em que o tema é a invasão de franceses em Portugal.

Maria Leite, conhecida de filmes como Mutant Blast e Diamantino, parece querer seguir as pegadas da internacionalização de Nuno Lopes, ator que tem tido mercado em França. Em Os Tradutores, a atriz portuguesa tem um dos papéis principais e brilha num thriller sobre a arte de traduzir de forma secreta um bestseller. O filme já tem distribuição garantida em Portugal para março e poderá fazer maravilhas para a carreira desta atriz sediada no Porto.

Portugal é o tema da comédia Uma Reforma à Portuguesa ou, traduzido literalmente, Reforma Alegre (Joyeuse Retraite), de Fabrice Bracq, em que um casal de reformados burguês quer mudar-se para Portugal por estar na moda e por ser mais barato. A comicidade do filme assenta nas peripécias destes franceses em tentar encontrar uma casa em Portugal e ter coragem de avisar os filhos que preferem o sol português. Um filme de grande público que não hesita em caricaturar um emigrante português que fala francês com sotaque tolo. Thierry Lhermitte e Michéle Laroque são as estrelas e a estreia está igualmente garantida em Portugal. Depois de A Gaiola Dourada, o cinema francês volta a colocar Portugal no mapa. Resta perceber se o público português acha piada à coisa...

Do melhor que foi visto nestes encontros, destaca-se L'Adieu a la Nuit, de André Téchiné. O cineasta francês não promoveu este seu filme com Catherine Deneuve por se encontrar doente. Deux Moi, de Cédric Klapisch, impôs-se como uma das comédias mais conseguidas desta fornada. Um conto parisiense sobre dois jovens vizinhos que estão constantemente numa rota de desencontros. Um Klapisch ao nível de A Residência Espanhola. Un Divan a Tunis, de Manele Labidi Labbé, e Le Prince Oublié, de Michel Hazanavicius, foram também alguns dos melhores filmes propostos à imprensa, mesmo que em Portugal possam ter uma vida comercial algo limitada.

Aliás, muitas das comédias comerciais aqui mostradas revelam uma falta de humor universal, fazendo gala em usar e abusar de uma linguagem nada exportável. Ainda assim, a organização realçou que depois do cinema americano, é o francês o maior exportador mundial de cinema.

No mercado, percebeu-se pelos corredores que dificilmente poderá haver um novo blockbuster francês de gama idêntica a Amigos Improváveis ou O Fabuloso Destino de Amélie Poulain, mesmo quando foi divulgado o orçamento de Astérix e Obélix: L'Empire au Millieu, de e com Guillaume Canet, ainda em fase de rodagem: 75 milhões de euros, números estratosféricos no contexto europeu.

Do brilho das estrelas, destaca-se a disponibilidade de Juliette Binoche, vista em La Bonne Épouse, de Martin Provost, comédia falhada sobre uma escola de etiqueta na província francesa dos anos 1960. "Este filme mostra como o amor muda a nossa vida", disse numa entrevista que o DN publicará na altura da estreia do filme. Elia Suleiman, o palestiniano mais parisiense do mundo, também falou ao DN para promover o seu mais recente manifesto de liberdade, It Must Be Heaven, não se cansando de reafirmar a sua amizade com o produtor Paulo Branco e o seu espanto pelo falhanço comercial do filme, em parte explicado pelo caos criado pelas greves em França.

Isabelle Huppert, por sua vez, foi das presenças mais sorridentes nestes encontros. A atriz fartou-se de promover La Daronne, uma comédia na qual interpreta uma tradutora da polícia que se reinventa como dealer de droga. "Quando vi o filme não me ri nas partes que eram para rir, acabei por dar gargalhadas devido a pequenos detalhes", contou aos jornalistas.

O filme com melhor reputação depois destes encontros acabou por ser a nova comédia de Jan Kounen, Mon Cousin, onde está Vincent Lindon como protagonista. Um mercado que também se agitou com o anúncio de De Gaulle, de Gabriel le Bomin, previsto já para março. Porventura a maior produção do ano que relata a resistência do general De Gaulle durante a invasão nazi. Poderá ser o papel da vida de Lambert Wilson.

Segundo a organização, Portugal é dos países que mais aposta na compra de filmes franceses mas, mesmo assim, incapaz de entrar para um top 20 dos países que mais fatura com esse cinema. No primeiro lugar do top está agora a Itália, um entre os 150 distribuidores mundiais e 115 jornalistas internacionais que entrevistaram estrelas como Juliette Binoche, Isabelle Huppert ou François Civil.

A UniFrance, o departamento governamental criado para celebrar o cinema francês, comemorou os 70 anos num jantar para os jornalistas em que o seu presidente, o antigo crítico Serge Toubiana, entregou a Olivier Assayas o prémio de carreira. O realizador de clássicos como Irma Vep ou As Nuvens de Sils Maria fez um agradecimento especial e muito tocante a Juliette Binoche, uma das suas grandes musas.

Em 2020, o mercado português vai estar inundado de cinema francês, em especial com dezenas de filmes adquiridos pela NOS Audiovisuais. Resta perceber se esta abundância não resultará em fartura. Para já, Wasp Network, de Olivier Assayas, com Penélope Cruz e Gael Garcia Bernal, continua, infelizmente, fora da lista de estreias e é bem provável que apenas possa estar disponível via Netflix. No entanto, ao DN, um distribuidor português confessou que neste ano não vai apostar no cinema francês devido aos recentes desastres de bilheteira.

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