Um belo padre por mês

Há oito anos que em Roma e pela internet se pode comprar, por apenas meia dúzia de euros (ou dez, já com despesas de correio para qualquer parte do mundo), um calendário cheio de informações úteis sobre o Vaticano, ilustrado com fotos dos mais belos padres da cristandade.
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O AUTOR da ideia assegura que não existe qualquer intenção de apelar a fétiches ou ao imaginário libidinoso de muitas mulheres pelo mundo fora, mas as 13 fotos de padres que todos os anos ilustram o Calendário Romano de Piero Pazzi são um mostruário do que de mais belo o catolicismo faz desfilar nas ruas da Cidade Eterna.

«Não! Veja o padre de Novembro, por exemplo... O calendário e as fotos podem ser vistas em 360 graus, tudo vai depender de quem olha», assegura o italiano, que é investigador de arte e se dedica à fotografia com um sentido lúdico que o seu trabalho como inventariador de templos e santuários não lhe permite.

O PADRE de Novembro talvez tenha umas borbulhas na cara que não se admitiriam num qualquer manequim da moda, mas ainda assim ilustra muito bem o apelo que a edição – vai na oitava – do calendário também propõe.

Os modelos seleccionados por Pazzi são todos padres católicos que transitam por Roma, mas não são necessariamente italianos: o padre de Fevereiro, por exemplo, é espanhol, de Saragoça, e na cidade que acolhe o micro-estado do Vaticano, o fotógrafo – que é de Veneza – apanha na sua objectiva sacerdotes de toda a Itália. Todos são muito, muito bonitos.

«Insisto que a intenção está nos olhos de quem vê», disse à NS’ Piero Pazzi, mesmo perante as imagens dos curas de Agosto ou de Outubro, a quem a sotaina parece cumprir apenas a função de disfarçar o pecado. Incapaz de confessar, Piero insiste que a veste dá aos seus modelos casuais um ar sóbrio e elegante e admite que, se todos são tão jovens que é até difícil tratá-los por «senhor padre», tal se deve apenas a uma mensagem subliminar de... futuro. «Os jovens são o futuro e é isso que as imagens transmitem.»

A ACOMPANHAR cada uma das fotos captadas com os modelos em actividades do seu quotidiano de sacerdotes, ou apenas no vaivém constante por Roma, o calendário publica muita informação sobre o Vaticano, o que inicialmente motivou o fotógrafo. «Percebi que não havia muita informação turística sobre o Vaticano e este é um souvenir muito interessante para os milhares de turistas que visitam a cidade-Estado.»

Além do mais, como Piero mantém em aberto um casting para renovar o seu lote de padres, pode bem acontecer que o turista compre a recordação e dê de caras com o prior da sua freguesia. «Casting talvez não seja a palavra mais adequada mas é a que uso para nomear a lista em que os padres podem inscrever-se se pretenderem figurar no calendário. O padre de Saragoça foi assim..., se algum estiver de passagem por Roma e gostar de integrar esta iniciativa de promoção do Vaticano, eu terei todo o gosto em fotografar, é só acertar as agendas», assegura, feliz com o sucesso da ideia que lhe surgiu quando já se sentia saturado de fazer calendários com gondoleiros e anjos.

A provar que a ideia, nascida em 2003, é boa está o facto de a edição de 2009 ter tido 90 mil exemplares impressos e de todos terem voado directamente para as mãos de clientes oriundos da cristandade universal (católico significa precisamente universal) ou para entrepostos de venda a retalho que não consta tenham ficado com os padres encalhados...

«HÁ GENTE de todo o mundo a comprar o calendário. Sei que muitas pastoras protestantes os compram para oferecer aos seus maridos, muitos católicos compram para oferecer à esposa ou à mãe. Tenho contactos dos EUA, da China, de todo o lado», conta o editor.

O calendário compra-se nos quiosques romanos a seis ou sete euros, mas Piero Pazzi pode despachá-lo para qualquer parte do mundo ao preço único de dez euros. «Estou a pensar fazer uma impressão no México para poder baixar um pouco este preço e proporcionar aos católicos da América Latina a possibilidade de terem esta recordação. Os custos lá são mais baixos e com certeza dará para ter uma edição mais barata e acessível a uma zona do mundo onde não é assim tão fácil pagar produtos em euros», conta Piero.

No capítulo dos projectos está uma edição em português – a hipótese de imprimir no Brasil diluiu-se na apatia do contacto brasileiro – e também em alemão. «Seria muito interessante porque o mundo português é muito católico e no caso da Alemanha seria para aproveitar, obviamente, o facto de o papa ser alemão», explica, desfiando depois dificuldades com a versão francesa. «Sabe, não percebo nada de francês e um dia caí na asneira de usar um conhecimento da internet para traduzir as informações em francês. Ficou tudo horrivelmente traduzido e foi um fiasco», confessa, explicando porque não agarrou ainda com unhas e dentes as propostas que lhe chegaram da China e de Taiwan.


Benemérito... às vezes

Das autoridades eclesiásticas, Piero Pazzi nunca ouviu um reparo ou uma queixa. «O texto é muito simples, apenas informação turística sobre o Vaticano, que estava muito mal divulgado», diz. «Não tive nunca qualquer problema.» Cauteloso, o fotógrafo-investigador confessa que a fotografia é o que menos lhe ocupa os dias mas também desmente informações que davam este hobby como grande alimento de uma suposta pulsão benemérita.

«Não faço caridade com o que ganho. Muitas vezes, aplico algum dinheiro em acções de patrocínio de algumas causas mas não gosto de falar muito disso», admite, acabando por contar que, há dois anos, resolveu investir algum do dinheiro ganho com os padres de Roma no restauro de uma estátua da Virgem, do século XII, que se encontrava meio esquecida na Via Vennezia, perto da casa onde mora.

«Era uma escultura muito bonita e estava muito degradada. Às vezes também apoio iniciativas dos templos e santuários onde trabalho como investigador e inventariador, mas não gosto muito de falar sobre isso e nem sequer tenho obrigação de investir dinheiro proveniente das vendas do calendário», argumenta.

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