PAICV propõe crioulo como língua oficial
Cabo Verde. Idioma é, nas suas variantes, instrumento de identidade local
Alteração constitucional é tudo menos garantida e ameaça criar divisões
A posse na Assembleia Nacional dos 13 membros da Comissão Eventual, presidida por José Manuel Gomes Andrade, deu início, em Cabo Verde, ao processo de revisão constitucional e seguem-se 90 dias de trabalho, antes de, havendo consenso, ser aprovada a nova lei fundamental.
Na mesa estão três projectos de revisão, apresentados pelo deputado do MpD Humberto Cardoso, e pelos dois maiores partidos do país, PAICV e MpD, e para além de um campo principal, o da justiça, que tem sido fortemente polémico, embora com zonas de consenso que, por exemplo, determinaram já o alargamento do Supremo Tribunal, agora constituído por sete membro. Há outros horizontes de intervenção, um dos quais vai de certo acentuar uma já assanhada discussão - a oficialização da língua crioula proposta pelo PAICV.
O tema da língua tem sido dos mais controversos, sobretudo por força das rivalidades locais que se acentuam à volta da variante do crioulo a adoptar, embora muitos considerem óbvia a escolha da que é falada, com raiz mais africana, na ilha de Santiago, onde vivem cerca de metade dos cerca de 500 mil cabo-verdianos residentes no arquipélago.
O crioulo, ou cabo-verdiano, como provavelmente virá a ser institucionalizado, não é área de consenso em Cabo Verde, já que se tornou, nas suas variantes, num instrumento de identidade local. Pode falar-se de nove variantes da língua, tantas quantas as ilhas habitadas do país, ou de duas linhas principais, a do Barlavento (Boa Vista, Sal, S. Nicolau, S. Vicente e Santo Antão) e a do Sotavento (Maio, Santiago, Fogo e Brava).
Os mais pragmáticos acentuam a necessidade duma decisão política, mesmo radical, lembrando que as línguas se estruturam a partir de um centro, que, porém, não anula especificidades regionais. No entanto, existe uma ligação tão emocional aos registos linguísticos locais que a discussão pode vir a criar uma divisão muito séria.
Nesta matéria, a revisão constitucional pode vir a confirmar uma previsão já antiga: a de se meter num vespeiro quem se disponha a oficializar um crioulo que não seja nacionalmente aceite e reconhecido.