Americanos já não temem Roma quando votam
Filho de um pai queniano de nome muçulmano e tendo vivido com a mãe e um padrasto na Indonésia, o mais populoso dos países islâmicos, Barack Obama foi alvo durante a campanha presidencial de numerosas especulações sobre a sua religião. Com Hussein como nome do meio, foi fácil alimentar as teorias de que o candidato democrata, agora já Presidente, era um crente não assumido do islão. E chegou a ser divulgada uma fotografia de Obama com vestes brancas e um turbante somali, recordação de uma visita ao Quénia, a uma das várias regiões desse país africano onde a influência islâmica é visível. Nunca se chegou a saber a origem da imagem, afixada no site Drudge Report, mas as suspeitas recaíram sobre os meios ligados à candidatura de Hillary Clinton, que então tentava ainda ser a aposta do Partido Democrata para enfrentar o republicano John McCain. Obama, que frequenta com a sua mulher, Michelle, uma igreja protestante, desmentiu sempre ser muçulmano, mas esforçou- se também por não dar muita importância às especulações sobre a religião que segue.
E a verdade é que a 4 de Novembro, este afro-americano de 47 anos conquistou sem grandes dificuldades a Casa Branca, e nem a raça nem a religião se revelaram significativas no triunfo sobre McCain, um representante da tradicional elite WASP, acrónimo inglês para brancos protestantes anglo-saxões, o grupo que deu 42 dos 44 presidentes dos Estados Unidos.
Se a raça de Obama (um mestiço, filho de uma branca do Kansas) foi tema persistente de campanha, mesmo que o candidato tenha feito tudo por não se apresentar como o representante exclusivo dos 13% de afro- -americanos do país, já a religião, com polémicas sobre o nome Hussein ou não, não o foi. E também não o foi em 2004, quando o catolicismo de John Kerry nada teve que ver com a sua derrota frente a George W. Bush. Uma situação muito diferente da que aconteceu em 1960, quando John Kennedy teve de vir a público reafirmar o seu patriotismo e que o facto de ser católico não significava qualquer dever de obediência política ao Papa. Kennedy ganhou e até se transformou num dos presidentes míticos da América, mas três décadas antes, em 1928, um outro candidato católico, Al Smith, viu a sua religião ser um dos factores da derrota da sua candidatura à Casa Branca, sempre com base na suspeita de que um católico tem de seguir as instruções do Vaticano e do Papa, um chefe de Estado estrangeiro.
O preconceito contra o catolicismo foi decaindo com os tempos, ao ponto de hoje haver uma maioria católica no Supremo Tribunal, o órgão onde mais se define os contornos da sociedade americana. E o actual Congresso é de longe o mais plurirreligioso da história americana, com uma representação excepcional de judeus e ainda com dois membros muçulmanos e dois outros budistas.
Curiosamente, os hindus, apesar da crescente visibilidade dos americanos de origem indiana, não aparecem em destaque na política. Não há nenhum no Senado nem na Câmara dos Representantes. E o único governador, entre 50, que nasceu numa família hindu, Bobby Jindall, da Luisiana, converteu-se ao catolicismo quando andava no liceu.