24 setembro 2006 às 00h00

Corredores de lâmpadas iluminam noites de Lisboa

Kátia Catulo

Gonçalo Santos (foto)

Pode ser que ao virar uma esquina de Lisboa dê de caras com um pedinte profissional. Ao atravessar uma rua seja atropelado por um cortejo de bailarinos vestidos de veludo e de luz. E ao subir o Bairro Alto se perca numa floresta de lanternas vermelhas. Tudo isso é possível porque até sábado, dia 30, a capital recebe a Luzboa, a II Bienal da Luz.

São dez dias para viajar pela cidade entre as 20.00 e a meia-noite de olhos postos em candeeiros com filtros vermelho, verde e azul. Cada cor corresponde a um circuito. E em cada caminho há instalações de artistas portugueses e estrangeiros montadas nas ruas, suspensas nas árvores, projectadas nos edifícios ou nos muros da cidade.

A Luzboa foi concebido pela associação cultural Extramuros e de-senvolve-se ao longo de quatro quilómetros, onde 24 intervenções no espaço público esperam pelos visitantes. Descobrir cada obra de arte urbana pode ser uma tarefa solitária ou então uma visita guiada. Todos os dias, até ao próximo sábado, Patrícia Freire, da organização do evento, marca encontro às 20.30 no Jardim do Príncipe Real com todos os que queiram visitar a segunda edição da Bienal de Luz em troca de uma moeda de um euro.

A viagem prolonga-se por duas horas e tem várias paragens obrigatórias. No Jardim do Príncipe Real a peça da checa Jana Matejkova, Coraçao, reproduz o batimento cardíaco da cidade de Lisboa; no Miradouro de São Pedro de Alcântara, uma constelação de cem lanternas intermitentes ocupam um espaço que há mais de dois anos encontra-se em obras; no Largo da Trindade, uma casa feita de ripas convida qualquer um a entrar e a descobrir os jogos de luz entre as brechas da madeira.

À entrada do Chiado termina o circuito vermelho e começa o verde. Um mendigo sentado no chão, pede a nossa atenção e trocos esquecidos nos bolsos. É a primeira entre um conjunto de quatro intervenções que o espanhol Javier Nuñes Gasco intitulou de Misérias Ilimitadas. Os transeuntes são surpreendidos por pedintes profissionais. Cada um deles recebeu formação específica sobre como vestir e comportar-se como um mendigo. Organizados numa lógica de empresa, apelam à generosidade dos lisboetas e turistas exibindo cartazes onde as letras estão desenhadas a néon de várias cores.

Na fachada dos Armazéns do Chiado crescem plantas e flores virtuais. Sur Natures, de Miguel Chevalier, é uma instalação interactiva, activada pelo movimento de pessoas e de carros. As imagens geradas por um programa concebido pelo próprio artista, reagem aos estímulos da cidade. Sempre que o trânsito e o fluxo de transeuntes é intenso, a vegetação desperta para uma coreografia imprevisível. E sempre que Lisboa adormece, as searas, os malmequeres ou as espigas reflectidas no edifício deixam-se ficar quietas à espera do próximo impulso urbano.

O percurso da Luzboa termina no circuito azul, onde começam as subidas e descidas íngremes da cidade. Nas Escadinhas de São Cristóvão, o trio Het Pakt estendeu dezenas de telas com rostos projectados. Cada uma delas é uma fotografia de um dos moradores da freguesia de São Cristóvão e São Lourenço. Para montar o Fado Morgana os artistas belgas convidaram os residentes do bairro a fazer audições de voz. Coros de fado vadio cantados por quem ali mora é o que se pode escutar nos becos e nas esquinas.

Há ainda duas peças que fazem parte da bienal, mas que só estarão expostas a partir de terça-feira. Tratam-se do Museu do Triciclo, um contentor instalado por Rigo no Terreiro do Paço e de uma instalação dos artistas portugueses Adriana Sá e Hugo Barbosa montada até 5 de Outubro no Largo do Correio Mor.