Eleições são este sábado
26 abril 2024 às 22h52
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FC Porto. Mais do que um confronto de gerações, um choque ideológico

Pinto da Costa pela Lista A, André Villas-Boas pela Lista B e Nuno Lobo pela Lista C, um deles será hoje eleito presidente.

Não é só um confronto de gerações - quando Pinto da Costa foi eleito presidente, André Villas-Boas tinha 4 anos por exemplo - é um choque ideológico entre o que foi feito e o que é preciso fazer.

Hoje, entre as 09.00 e as 20.00 no Estádio do Dragão, os sócios do FC Porto elegem os órgãos sociais para o quadriénio 2024-28.

O atual presidente vai votar às 11.00, enquanto o ex-treinador exercerá o direito de voto às 12.00 e Nuno Lobo às 13.30. Miguel Brás da Cunha, líder da lista D, que apenas concorre ao Conselho Superior vota às 11.00.

Pinto da Costa renovou a equipa, apostou em António Oliveira e fez promessas outrora desnecessárias

Para o universo portista é quase impossível imaginar um FC Porto sem Jorge Nuno Pinto da Costa. Presidente desde que sucedeu a Américo de Sá a 17 de abril 1982, teve apenas três opositores nas urnas em 42 anos: Martins Soares (1988 e 1991), José Fernando Rio e Nuno Lobo (2020). Os troféus ganhos fizeram dele o líder mais titulado do Mundo e sempre foram o seu maior trunfo e uma força de bloqueio a quem sequer pensava ir contra as ideias dele. O cenário financeiro-desportivo menos risonho dos últimos anos elevaram a contestação e André Villas-Boas, outrora discípulo desejado, tornou-se um opositor sério a um 16.º mandato seguido. 

Os 68,65% de votos recolhidos há quatro anos - face a José Fernando Rio (26,44%) e Nuno Lobo (4,91%) - determinaram a percentagem mais baixa em 15 atos eleitorais e colocaram-no na mira dos contestatários. Pinto da Costa (lista A) foi inclusivamente obrigado a fazer campanha eleitoral e sacar de (supostos) trunfos - “atos de desespero de quem não quer sair da cadeira do poder” segundo Villas-Boas.

A começar pelos anúncios do fim do pagamento de prémios aos administradores da SAD e da renovação com o treinador Sérgio Conceição, confirmada esta quinta-feira. Na verdade tudo (ou quase) na lista do Todos pelo Porto é sinal de mudança. Com 2586 troféus obtidos em 21 modalidades, 68 dos quais no futebol, Pinto da Costa sempre torceu o nariz às apostas no futsal e no futebol feminino, que desta vez são bandeiras eleitorais.

Contestado em toda a linha - gestão desportiva, financeira e infraestrutural - o atual líder portista revolucionou a equipa diretiva para um novo mandato. Mudou cinco nomes, afastando os polémicos Adelino Caldeira e Fernando Gomes e manteve apenas Vítor Baía, acrescentando António Oliveira, nome consensual no universo portista, e ainda João Rafael Koehler, Marta Massada, Vítor Hugo e Nuno Cerejeira Namora. Lourenço Pinto para a Mesa da Assembleia Geral e Ricardo Valente para o Conselho Fiscal e Disciplinar são as outras apostas de Pinto da Costa, o sócio número 587.

A aposta no empresário João Rafael Koehler para o pelouro financeiro pretendia ser bandeira de transparência e boa governança, sustentabilidade e crescimento financeiro, mas tem sido mais uma pedra no sapato que um trunfo. O anunciado negócio do naming do Estádio do Dragão revelado há dias é uma medida impactante e implica a exploração comercial do recinto a 25 anos pela Ithaka a troco de 65 milhões de euros. O acordo pode ser denunciado até ao dia 1 de julho, mas não deixou de causar polémica e ser reflexo do desenfreado anúncio de medidas por parte do atual líder, que também mostrou o terreno onde irá nascer a Academia da Maia (ainda sem projeto edificado). 

O passivo de 522 milhões de euros é difícil de explicar, mas o presidente portista promete um refinanciamento do passivo em 250 milhões e a estabilização financeira em dois anos, graças à já efetivada antecipação de 54,3 milhões em receitas audiovisuais. 

André Villas-Boas, o desafiador quer libertar clube de amarras financeiras e reter talento

A “cadeira de sonho” afinal era outra - a de Pinto da Costa. A célebre frase do agora candidato à presidência do FC Porto, quando nessa outra vida, a de treinador, assumiu o comando o comando técnico dos dragões na época 2010-11, que terminou com a conquista da Liga Europa, faz hoje todo o sentido. Seja qual for o resultado nas eleições de hoje, honra seja feita ao antigo treinador, que, mesmo ameaçado, não recuou e avançou contra o homem que um dia foi o seu presidente, aquele que lhe deu a oportunidade de sair da sombra de José Mourinho. Formalizou a candidatura no dia 26 de março com a entrega de 2170 assinaturas para dar “voz a um número crescente de portistas insatisfeitos”. 

Nunca em 42 anos alguém enfrentou Pinto da Costa com tanta força como Villas-Boas o fez agora. As cinco mil pessoas que juntou no pavilhão Rosa Mota no fecho da campanha são um exemplo da pujança mobilizadora do sócio número 7616, líder da lista B, que quer “libertar o clube das amarras e interesses que tantos danos causaram nos últimos anos”. 

“Grato” a Pinto da Costa pelos “últimos 42 anos” que deixam memórias que os sócios jamais esquecerão, não há “dívida de gratidão” que salve o clube da “ruína”. Nunca escolheu as palavras para dizer o que “tem de ser dito”. Seja a acusar o líder portista de “mentir aos sócios” ou a chamar “sanguessuga” a João Koehler. O “passivo gigantesco” de 522 milhões de euros e uma dívida de 310 milhões são um problema a resolver o quanto antes, com ajuda da Banca internacional e assim evitar a ameaça de exclusão das competições da UEFA por três anos.

Villas-Boas apresentou-se com uma lista forte, mas pouco mediática e sem muito peso no universo portista mais profundo, com exceção de o economista Angelino Ferreira, que foi administrador financeiro da SAD do FC Porto e vice-presidente do clube na era Pinto da Costa e que se candidata ao Conselho Fiscal e Disciplinar. António Tavares, provedor da Santa Casa da Misericórdia do Porto e ex-deputado pelo PSD à Assembleia da República, foi designado para a Mesa da Assembleia Geral, enquanto Fernando Freire de Sousa, líder do Conselho Geral da Universidade do Porto e ex-secretário de Estado, concorre ao Conselho Superior.

Para comandar a estrutura do futebol escolheu Zubizarreta (ex-Barcelona) e Jorge Costa. E para liderar o projeto do ecletismo Mário Santos (antigo chefe da Missão Portuguesa nos Jogos Olímpicos de Londres 2012 e Brasil 2016).

A candidatura do Só há um Porto estima que votem entre 30 a 35 mil portistas, número que superará o recorde de votantes de 1988, ano da primeira reeleição de Pinto da Costa - 10 700 votantes. Podem votar todos os sócios que tenham a quota de março regularizada e a renumeração efetuada.

Nuno Lobo, o repetente que fazer melhor que em 2020 reclamando a bandeira do ecletismo

Nuno Lobo volta a apresentar-se a  votos. Depois de em 2020 ter reunido 4, 90%, o professor e empresário  recolheu 330 assinaturas e avançou. “Concorro contra dois candidatos que dispõem de poder financeiro e protagonismo mediático incomensuravelmente superior aos meios desta candidatura”, admitiu o líder da lista C, recusando ser“um candidato invisível” mas lamentando a “falta de visibilidade da candidatura e do programa”.

Os capitais próprios negativos e a falta de ecletismo do clube foram algumas das razões que o levaram a recandidatar-se. “Fui eu que lancei primeiro a bandeira do futebol feminino e do futsal para o FC Porto em 2020”, atirou em jeito de recado a Pinto da Costa, que também anunciou essa intenção depois de anos a recusar apostar nessas modalidades. Apesar disso tem optado por um discurso em defesa do atual presidente e um apontar de dedo a Villas-Boas.

A formação como alimento das equipas principais das modalidades coletivas norteiam a recandidatura de Nuno Lobo, assim como o reforço infraestrutural, a reabilitação financeira e o aumento do ecletismo. 

Sob o lema Sim, Somos Porto, o líder da lista C propõe o advogado Luís Barradas para a Mesa da Assembleia Geral e o gestor Heleno Roseira para o Conselho Fiscal e Disciplinar, tendo abdicado de disputar o Conselho Superior - órgão consultivo do clube, que é eleito através do método de Hondt e que conta outra vez com um movimento autónomo liderado pelo advogado e docente universitário Miguel Brás da Cunha (lista D).

Manter Sérgio Conceição é imperativo, segundo Nuno Lobo, pela “mística” e por tudo o que representa no FC Porto: “É o ADN, a garra, o querer... ele detesta perder, como eu, que odeio perder. Nós só vemos as coisas más, como o Sérgio ser indisciplinado. Como é que uma pessoa pode ser disciplinada com estas arbitragens?”