Balanço de oito anos de governação
27 março 2024 às 09h50
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Costa realça que país "ultrapassou situação crónica de défice". "Entendo que cumpri bem a minha missão"

O primeiro-ministro cessante faz o balanço da sua governação. "Oito anos volvidos, podemos dizer que, felizmente, temos um sistema financeiro estabilizado", disse Costa, tendo referido, em conferência de imprensa, as muitas crises que o Executivo socialista enfrentou, como a pandemia de covid-19 e a guerra na Ucrânia. 

António Costa fez esta quarta-feira um balanço dos oito anos em que esteve à frente do Governo, numa altura em que faltam poucos dias até à tomada de posse de Luís Montenegro como o novo primeiro-ministro, marcada para 2 de abril.

"Foram oito anos em que tivemos de enfrentar múltiplas crises e resolver essas múltilplas crises", começou por dizer António Costa, referindo-se, por exemplo, à crise financeira. "Oito anos volvidos, podemos dizer que, felizmente, temos um sistema financeiro estabilizado", disse. 

"Mantivemos uma trajetória constante de melhoria das contas públicas", explicou Costa, indicando que se passou de uma "situação por défice excessivo, em 2015, para uma situação de saldo positivo, em 2023", apesar de, considerou, não ter sido um percurso fácil, salientou.  

Costa referiu-se depois a outra crise que o país, e o mundo, atravessou, provocada pela covid-19. "Já conseguimos recuperar do impacto da pandemia nas nossas contas públicas e fechamos 2023 com um saldo positivo no orçamento".

O primeiro-ministro cessante falou também "da grande crise, dramática" que "teve a ver com os incêndios florestais, em 2027". Falou na resposta que foi dada depois, referindo-se às medidas de prevenção, no ãmbito do combate dos incêndios florestais, referindo a melhoria na redução da área ardida. 

Disse, no entanto, que "bons resultados" não permitem baixar a guarda nesta matéria.

Voltou a falar da pandemia de covid-19, destacando que Portugal "é o primeiro país do mundo a atingir uma taxa de cobertura vacinal de 85%". Disse ainda que Portugal foi um dos países em todo o que melhor saiu desta crise, referindo o apoio do Estado às famílias.

Após a covid-19, falou na guerra na Ucrânia, em curso há mais de dois anos, que conduziu à "maior crise infacionista dos últimos 30 anos". 

Referindo-se a uma "subida dramática da inflação", em que se chegou a uma taxa de inflação de "10,1% em outubro de 2022", Costa falou numa trajetória lenta para se chegar a um valor 2,1% em fevereiro passado.   

Falou depois em "mudanças estruturais" nestes oito anos de governo socialista, entre as quais o crescimento económico. Desde 2016 “a realidade é bastante diferente”, com um crescimento em média de 2,1%. "Nestes oito anos, o país cresceu 10 vezes mais do que aquilo que tinha crescido nos 15 anos anteriores", destacou Costa. 

Enumerou depois vários indicadores económicos positivos como emprego e salário mínimo, o que contribuiu para uma distribuição da riqueza e para um aumento do peso dos salários no PIB.

"No conjunto destes oito anos, a pensão média subiu 23,3%", realçou, além de referir a "melhoria de salários".  Indicou ainda as reduções do IRS e as sucessivas medidas de apoio às famílias, como a gratuitidade dos manuais escolas, as alterações nos transportes e as creches gratuitas.

O foco passou depois para a educação, tendo realçado "uma diminuição muito significativa do abandono escolar precoce" e "mais recursos humanos mais qualificados".  Disse que o número de jovens na universidade é agora de 54%.

O investimento empresarial também foi um dos destaques nas declarações de Costa.

“Todos os anos batemos recordes na atração de investimento direto estrangeiro, no investimento empresarial", que aumentou 85% entre 2015 e 2023. "Aqueles que achavam que para sermos competitivos tínhamos de estrangular salários, manifestamente estavam enganados”, concluiu, para dizer depois outro bom indicador das exportações.

"Cada um ficará com o souvenir que entender da minha governação”

Sublinhou ainda a descentralização na educação, na área da ação social e na saúde, nesta última ainda não se atingiu os 100%.

Na parte dedicada às questões dos jornalistas, Costa disse que nunca esteve “preocupado com marcas: Cada um ficará com o souvenir que entender da minha governação”. 

"Entendo que cumpri bem a minha missão. Não só tendo feito o país ultrapassar uma situação crónica de défice... em 50 anos de democracia, tivemos duas situações de saldo positivo, em 2019 e agora em 2023 ", disse, mais tarde, realçando, no entanto, que há sempre imprevistos, como se quisesse mostrar a importância das contas certas.

Ainda sobre o saldo positivo, disse: “felizmente" quem governa e quem faz oposição fica com "mais liberdade” para tomar decisões, conclui Costa.

O primeiro-ministro destacou que o excedente orçamental de 1,2% alcançado em 2023 não veio do nada e congratulou-se com o facto de deixar o próximo Governo com "liberdade de escolha", recordando que não lhe aconteceu o mesmo. 

"Onde é que está a chave do saldo positivo do ano passado? Está no enorme crescimento das receitas da Segurança Social. É o saldo de 5.670 milhões da Segurança Social que cobriu o défice de 2.322 milhões do Estado, das regiões e das autarquias locais", salientou.

António Costa defendeu que esse saldo positivo da Segurança Social tem origem no facto de ter havido "mais empregos do que o que tinha sido previsto", mas também porque os salários "subiram muito acima do que tinha sido o acordo estabelecido no acordo em concertação social" - tinha sido acordado um aumento de 5%, e foi de 8%.

"Eu acho que são três boas notícias: primeiro, tivemos mais emprego. Segundo, os aumentos salariais foram superiores ao que tinha sido esperado e acordado e, em terceiro lugar, isto permitiu que o Estado precisasse de menos dinheiro para se financiar e tenha podido reduzir a dívida pública, deixando, por isso, menos encargos para o futuro", afirmou.

Sem querer pronunciar-se sobre qualquer medida em concreto do futuro Governo, António Costa salientou, contudo, que, quando se olha para o saldo de um ano, é preciso "diferenciar o que são despesas extraordinárias e irrepetíveis", como "construir um aeroporto ou fazer um linha de TGV, de despesas permanentes, "como aumentar pensões ou salários".

Sobre a escolha da localização do novo aeroporto de Lisboa, o ainda chefe do Governo disse esperar que haja uma decisão agora que Luís Montenegro está prestes a tomar posse como primeiro-ministro.

Recusou, porém, dar a sua opinião sobre o impasse na eleição do novo presidente da Assembleia da República, no arranque dos trabalhos da XVI legislatura. 

“Já não sou comentador e ainda não sou comentador, talvez um dia venha a ser”, afirmou o primeiro-ministro cessante, tendo abordado os temas da pasta de transição pública do XXIII Governo Constitucional.

Costa considera que seria positivo que privatização fosse feita "sem ser sob pressão"

O primeiro-ministro cessante considerou que seria "muito positivo" que a privatização da TAP fosse feita "sem ser sob pressão", apesar de ressalvar que cabe agora ao futuro executivo decidir se avança com a venda da companhia.

António Costa falava na residência oficial, em São Bento, e quando questionado sobre o facto de ter sido hoje anunciado que a TAP alcançou no ano passado o maior resultado líquido de sempre, com um lucro de 177,3 milhões de euros, o primeiro-ministro disse ficar "muito satisfeito" que a companhia aérea tenha lucros.

"Espero que seja uma boa notícia para todos e que ninguém ache um excesso a TAP ter lucros", ironizou, numa alusão a declarações do presidente do PS, Carlos César, que disse esperar que o excedente orçamental de 1,2% em 2023 não tenha sido um excesso.

Interrogado se concorda com o presidente da TAP, Luís Rodrigues, que considerou que a sua privatização é "muito importante", mas que o futuro Governo poderá precisar de tempo, António Costa considerou "muito positivo que a privatização se faça sem ser sob pressão". 

"Sabemos do passado que privatizações feitas sob pressão não dão bom resultado. Recentemente o Tribunal de Contas publicou uma auditoria, solicitada pela Assembleia da República, ao contrato de privatização da ANA, e acho que é uma boa ilustração do que é que significa privatizar sob pressão", afirmou.

Para o primeiro-ministro, uma privatização feita sem ser sob pressão permite "obviamente que o Estado a faça em melhores condições".

Costa salientou que o Governo deixa a TAP "recuperada do risco em que estava em 2020, como muitas companhias estiveram em todo o mundo de colapsar, devido à pandemia", estando hoje numa "boa situação".

"Havia muitos interessados, acho que os resultados da companhia só farão aumentar o número de interessados em serem parceiros do Estado ou na partilha de capital, ou na aquisição da totalidade do capital, mas isso caberá ao novo Governo decidir", salientou.

O ainda primeiro-ministro acrescentou que este executivo tinha o processo de privatização "todo preparado, do ponto de vista das decisões que o Governo tinha de tomar para a contratação das consultoras", até ao calendário.

"Naturalmente o novo Governo tem toda a legitimidade para tomar a decisão que entender, de acelerar a privatização, de decidir não privatizar, de privatizar mais, privatizar menos, a quem privatiza...", disse.

Primeiro-ministro cessante espera que relação de Marcelo com futuro Governo seja "ainda melhor" do que foi com o seu

O primeiro-ministro manifestou o desejo de que as relações entre o Presidente da República e o futuro Governo sejam tão boas "ou, se possível, melhores ainda" do que foram com o seu, afirmando não se recordar de uma "relação tão cooperante".

Apesar de ter destacado que houve uma relação positiva com Marcelo Rebelo de Sousa, António Costa também reconhece que houve momentos de tensão.

Voltou a referir que é difícil encontrar-se "no passado oito anos de uma relação tão cooperante e, como disse o senhor Presidente da República, até de solidariedade nacional entre o Governo e o Presidente da República" na história constitucional portuguesa.

"Não me recordo de oito anos em que a relação tivesse sido tão fluida. Agora, é normal que um Presidente da República que veio do hemisfério da direita e um primeiro-ministro que é do hemisfério da esquerda não concordem a 100%. O ponto de vista da ação governativa é necessariamente diferente do ponto de vista de quem exerce a função presidencial", disse.

No entanto, o chefe do executivo sublinhou que "o mais relevante não foram os momentos de desacordo, mas foram os momentos em que, apesar do desacordo", o Governo e o Presidente trabalharam "bem, em conjunto, para bem de Portugal e dos portugueses".

"O que desejo ao senhor Presidente da República é que possa concluir o seu mandato de uma forma que dê continuidade a este espírito de cooperação e de solidariedade ou, se possível, melhor ainda, porque eu acho que todos devemos desejar sempre o melhor para o nosso futuro coletivo", afirmou.

As declarações do primeiro-ministro cessante acontecem na véspera do seu sucessor apresentar ao Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, a constituição do novo Governo, na sequência dos resultados das eleições legislativas de 10 de março, ganhas pela Aliança Democrática (AD).  

Com Lusa