25 setembro 2016 às 00h57

França fecha a Selva e distribui dez mil migrantes por outros campos

Refugiados que peçam asilo serão levados para centros de acolhimento distribuídos por todo o país, onde ficarão no máximo quatro meses. Restantes serão acompanhados à fronteira.

Helena Tecedeiro

"França não vai ser um país cheio de acampamentos", respondeu François Hollande às críticas da direita ao plano do governo para encerrar a Selva de Calais, o maior campo de refugiados da Europa, até ao inverno. O projeto do executivo socialista obrigará a distribuir os cerca de dez mil migrantes que ali vivem por outros campos no território francês.

Em campanha para as primárias de novembro, a direita alertou para o perigo da multiplicação dos "mini Calais", apostando num discurso duro sobre a imigração para ganhar votos à extrema-direita. De visita a um centro de acolhimento em Tours, antes de se deslocar pela primeira vez amanhã à chamada Selva de Calais, Hollande garantiu que o desejo do governo é "encerrar definitivamente" o campo onde se amontoam milhares de refugiados em condições dramáticas, a maior parte apenas à espera de oportunidade de irem para o Reino Unido.

O inverno foi o limite fixado pelo presidente para as autoridades desmantelarem as tendas e contentores da Selva. No início do ano, os bulldozers já tinham arrasado a metade sul do campo. Mas com 40 a 80 novos refugiados a chegarem diariamente, a população da Selva anda hoje entre os sete mil e os dez mil migrantes (dependendo das fontes), na maioria afegãos, sírios, iraquianos, mas também originários do Sudão ou da Eritreia. O campo é uma verdadeira cidade com as suas próprias lojas, cabeleireiros ou bares. Mas a violência é frequente.

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Em Calais, quem vive nas imediações do campo - chama-se a Selva por ficar perto de uma floresta -, mas também os turistas e os motoristas de camião que atravessam o Canal da Mancha com as suas mercadorias, têm exigido o encerramento. Uns estão cansados de verem os seus campos pilhados ou vandalizados pelos migrantes, outros não querem mais viagens interrompidas porque alguém invadiu os túneis do Eurostar e os últimos receiam ser agredidos ou que entrem no reboque do seu veículo e estraguem a mercadoria. No início deste mês juntaram-se todos num mega protesto, que terminou com nova promessa do governo de que ia encerrar a Selva de Calais.

"Agimos de modo a acolher humanamente, de forma digna, pessoas que vão requerer asilo", explicou ontem Hollande. As restantes, "serão acompanhadas à fronteira". Enquanto esperam pela análise do pedido de asilo, os migrantes ficarão em campos com 40 a 50 pessoas, onde poderão ficar no máximo quatro meses. Esses centros de acolhimentos espalhados por todo o país ficarão situados em casernas, pavilhões desportivos, hospitais abandonados ou préfabricados.

A distribuição dos migrantes promete não ser pacífica. Sobretudo nas cidades governadas pela direita e extrema-direita. Em Henin-Beaumont, o presidente da Câmara Steeve Briois, da Frente Nacional, lançou a iniciativa "A Minha Cidade Sem Migrantes", deixando um apelo aos outros autarcas de França para fecharem as portas ao refugiados.

A decisão de acelerar o encerramento da Selva de Calais surge dias depois de duas cimeiras em Nova Iorque, uma patrocinada pela ONU e outra pelo presidente americano Barack Obama, para resolver o problema dos refugiados. Fugidos da fome e conflitos em África, da violência no Iraque e Afeganistão ou da guerra da Síria, milhares de pessoas continuam a arriscar a vida para chegar à Europa em busca de vida melhor. A Alemanha, que em 2015 recebeu mais de um milhão de migrantes, é o destino preferido. Mas a contrastar com a política de acolhimento da chanceler Angela Merkel, muitos países europeus rejeitam receber refugiados, abrindo divisões na União Europeia.